Os órgãos de imprensa brasileiros e as entidades de classe de jornalistas não podem, neste momento, fingir que não têm nada a ver com o que aconteceu
Um dia após o cinegrafista Santiago Andrade ter sido alvejado pelo rojão que o fez falecer alguns dias depois, o jornalista da Bandeirantes, Cláudio Humberto, no programa Primeira Hora, de sua emissora, afirmou, levianamente, que o repórter havia sido atingido por uma bomba lançada por policiais, repetindo o testemunho do jornalista Bernardo Menezes, da Globo News.
Logo, as investigações descobriram que, na verdade, a polícia não tinha nada a ver com isso, mas o artefato havia sido lançado mesmo por manifestantes, os quais já foram presos e confessaram o ocorrido.
Tal episódio apenas é mais um exemplo da atitude constante da mídia nacional diante das manifestações que surgiram pelo Brasil desde meados de 2013. Desde as primeiras delas, os órgãos de imprensa não cansaram de ressaltar uma suposta truculência policial, inclusive contra os próprios jornalistas. Também insistiram, incansavelmente, na tese de que a badernagem ocorrida invariavelmente era fruto da ação de pessoas infiltradas. Além disso, em nenhum momento a imprensa, tão investigativa em muitos casos, se esforçou por tentar identificar quem eram os verdadeiros fomentadores da bagunça.
O resultado disso tudo foi uma polícia receosa de agir com mais veemência, tentando apenas conter maiores tragédias, mas, por isso mesmo, acabando por permitir muito vandalismo. As manifestações, então, foram se tornando mais violentas, ainda que previsíveis, sempre com a cobertura da massa de manifestantes que servia para dificultar o trabalho de identificação dos arruaceiros. E, diante disso tudo, os financiadores se sentiram bastante à vontade para cooptar jovens para essas verdadeiras milícias, certos que sequer haveria quem perguntasse sobre a origem do problema.
Agora que o cinegrafista morreu, a imprensa nacional finge estar condoída. Não descansou até que dois jovens fossem tidos por culpados e, assim, aparentam satisfação pela justiça feita.
O que está claro, porém, é que, na morte de um de seus colegas, colocar toda a culpa em dois rapazes que, aparentemente, sequer têm noção da besteira que fizeram é uma maneira muito sem-vergonha de livrar-se da própria responsabilidade. Os órgãos de imprensa brasileiros e as entidades de classe de jornalistas não podem, neste momento, fingir que não têm nada a ver com o que aconteceu.
A mídia nacional, diante da morte de Santiago, deve ser considerada omissa, pois jamais trabalhou para entender as raízes do movimento, conivente, pois fez de tudo para encobrir a responsabilidade dessas manifestações pela violência ocorrida no seio dela, cúmplice, pois, desde o princípio atrapalhou a reação policial, tentando sempre enxergar violência desmedida no trabalho de repressão e responsável, pois, mesmo após a morte de seu colega, continua fingindo não saber quem são os verdadeiros culpados por tudo o que está acontecendo.