Autor: Fabio Blanco

Necessidade de Arrependimento

As pessoas têm muito medo de arrepender-se de suas escolhas, apesar de reiteradamente tomarem decisões equivocadas em suas vidas. Ainda assim, poucas reconhecem que se arrependem. Parece até que o arrependimento representa algum tipo de condenação.

Há uma cultura que rechaça o arrependimento e isso conduz a uma ilusão de que é possível viver sem ele. O problema é que uma vida sem arrependimentos não permite a autoavaliação, e quem não avalia a si mesmo não se corrige, ficando sujeito a cometer os mesmos erros de sempre.

No entanto, arrepender-se é algo absolutamente natural. A pessoa pode negar que o faz, mas não há ninguém que, se tivesse a chance, não mudaria alguma ação, fala ou omissão que cometeu.

O problema é que, em nossos tempos, o arrependimento é visto como sinal de fraqueza, insucesso ou mesmo resquício de uma superstição religiosa. Ele tornou-se algo vergonhoso. Por isso, todos tentam escondê-lo.

Por causa disso, o arrependimento tem sido sufocado, reprimido e racionalizado por esta geração, o que torna-a neurótica, obviamente. Melhor seria que ela não o evitasse, mas o aceitasse como uma reação espontânea de qualquer pessoa que tenha um mínimo de consciência.

Por isso, ninguém deveria fugir do arrependimento, mas aproveitá-lo para se tornar alguém melhor. Ninguém deveria negá-lo, nem fingir que aprova tudo o que fez na vida, mas usá-lo para promover as reformas pessoais necessárias.

Se o arrependimento, quando não usado para promover a melhora do indivíduo, pode ser considerado inútil, ao tornar-se instrumento para o crescimento pessoal se transforma em uma verdadeira via para sua salvação.

Filosofia e Espiritualidade

A dimensão espiritual, que envolve nossa fé e a nossa religiosidade, faz parte da estrutura da nossa vida. Querendo ou não, tendo consciência dela ou não, cultivando-a ou não, ela faz parte de nós, influencia nossas ações, determina o nosso destino. A pessoa pode ignorar sua dimensão espiritual, mas não é por isso que seus efeitos deixam de existir. A natureza humana é espiritual e compreender esse aspecto dela é essencial para se estabelecer um minimo de equilíbrio interior, de harmonia com o cosmos e de sentido existencial.

Porém, nosso tempo afastou sua inteligência do que é espiritual, afinal, é herdeiro de uma era racionalista, quando se estabeleceu que o guia da nossa vida deveria ser a Razão. Nos chamados séculos das luzes, a humanidade ocidental acreditou que poderia ser guiada por suas capacidades cognitivas e especulativas e lançou todas as suas esperanças sobre ela. Obteve, com isso, muitas conquistas no campo material, mas, para isso, precisou expulsar as coisas do espírito para o reino do desconhecido, do mistério, onde não cabiam a investigação e o debate, apenas o sentimento e a convicção subjetiva.

Nos séculos da Luzes, a transcendência não foi negada, mas lançada para um mundo inalcançável pelas vias racionais ordinárias. Tornou-se algo a ser acessado somente pelo inconsciente, por algum tipo de força interior, por meio de um salto de fé ou por uma espontaneidade anímica, sempre fora do controle da consciência. O reino do espírito tornou-se, então, assunto exclusivo de religiosos e espiritualistas, não de filósofos. Estes estavam demasiado ocupados tentando decifrar as engrenagens cerebrais, as leis gerais do pensamento e os movimentos mundanos para se ocuparem com o que eles não tinham como tratar empiricamente. Os iluministas exaltaram a razão, mas não foi este o seu erro (os medievais já haviam exaltado-a), mas fazer dela sua rainha e desassociá-la da transcendência.

No entanto, a razão não representa o ápice da condição humana. Ela é necessária, imprescindível, insubstituível, mas não pode ser o mestre a guiar os seus vassalos. Pelo contrário, a razão só tem valor se for submetida aos objetivos humanos, tendo funções bem definidas, como a ordenação, o discernimento e a seleção dos conteúdos da realidade. A razão é serva, não senhora, como queriam os iluministas.

A verdade é que quando tratamos da realidade, considerada em sua integralidade, veremos que ela ultrapassa os limites dos processos racionais. Há elementos dessa realidade que desafiam, contradizem e se furtam da mera racionalidade, e tais elementos não podem simplesmente ser ignorados.

E apesar da transcendência tratar-se de uma realidade superior, isso não quer dizer que se trata de uma realidade à parte. Ela pertence ainda à dimensão humana. Por isso, a filosofia, que tem por objetivo desvelar a realidade da qual o ser humano faz parte, não precisa abrir mão dela. Sendo assim, refletir sobre os conteúdos relativos ao supra-material, ao supra-sensível, ao metafísico está dentro do escopo do trabalho do filósofo. Se o transcendente pode ser objeto de investigação e de reflexão, de discernimento e de crítica, de conhecimento e de síntese, o filósofo estará pronto para exercê-los.

Por isso, há anos, eu proponho um método de estudo das questões espirituais, o qual eu denominei de Teologosofia, que nada mais é do que um olhar filosófico sobre a espiritualidade. O objetivo do método filosófico é clarear o entendimento sobre a realidade espiritual, fazendo dela mais compreensível. Não que eu negue a existência do mistério, do numinoso, mas sou convicto de que o mistério, quando se apresenta, deixa de ser misterioso para tornar-se compreensível. É mistério somente até deixar de sê-lo.

O apóstolo Paulo afirma que há algumas coisas que ainda são confusas, como num espelho, mas haverá um momento em que elas serão vistas claramente, como se face a face. Ora, algo que poderá ser compreendido em algum momento é porque, em si, já possui a qualidade de ser compreendido. De nossa parte, porém, não sabemos exatamente onde estão as fronteiras entre o atualmente compreensível e o apenas futuramente compreensível. Por isso, forçamos os limites da compreensão de tudo até o máximo, até termos certeza que não podemos mais compreender.

O fim da filosofia é a verdade e se algo é verdadeiro e pensável merece ser por ela abordado. De minha parte, sou convicto de que as coisas do espírito não são apenas verdadeiras, mas passíveis de reflexão, de meditação e de conhecimento. Por isso, me disponho, cotidianamente, a pensar sobre elas e compartilhar o que eu apreendo com as pessoas que se interessam em me ouvir.

Gradatividade do Conhecimento

Desde os filósofos da Antiguidade, passando especialmente pelos escolásticos, o conhecimento foi entendido como uma adequação do pensamento à realidade. A realidade era a referência, o ponto de apoio em relação ao qual o pensamento deveria adequar-se.

Nessa perspectiva objetivista, a coisa a ser apreciada, ou seja, o objeto do conhecimento, tendia a ser vista como algo fixo e acabado. Havia um pendor por encarar os elementos da realidade como eixos sobre os quais o pensamento deveria se debruçar.

O saber, nessa perspectiva, era entendido como uma absorção sequencial desses elementos, os quais seriam ingeridos devida e integralmente, uns após os outros, empilhando-se na alma da pessoa, formando assim o seu cabedal de conhecimento.

No entanto, é preciso reconhecer que nenhum elemento da realidade, por mais simples que seja, é absorvido, de uma vez, em sua integralidade. Quando tomamos conhecimento de um dado qualquer, ele não entra em nós em sua inteireza, mas parcialmente, passando por um filtro ativado por diversos fatores circunstanciais. Entre esses fatores encontram-se a cultura que formou o imaginário da pessoa, sua noção da própria ignorância, seu nível de instrução, sua capacidade física e muitos outros que podem influenciar a forma como ela assimila o conhecimento.

Fica claro, então, que aquilo que conhecemos, de acordo com as circunstâncias do momento do conhecimento, não é a coisa em si mesma, mas uma parte dela, um aspecto dela. Quando as circunstâncias mudam (e elas mudam ininterruptamente), absorvemos a mesma coisa de uma maneira diferente, fazendo com que ela não seja, de fato, a mesma coisa.

Em razão disso, cada vez que nos deparamos com um elemento da realidade qualquer, e de novo e de novo, é como se ele, cada vez, se abrisse um pouco mais, se desvelasse um pouco mais, permitindo que descubramos algo a mais sobre ele, nos aproximando um pouco mais de sua essência final. Por isso, dizemos que o conhecimento é um processo gradativo, ou seja, uma abertura progressiva para a realidade.

Isso não significa, porém, que a absorção parcial de uma coisa torna o conhecimento sobre ela inverídico. Pelo contrário, cada ato de conhecimento representa uma insinuação da verdade, um degrau na direção da essência da coisa, um passo em rumo à sua substância. Cada vez que conhecemos algo, ainda que em parte, desvelamo-no. Por isso, Tomás de Aquino dizia que a verdade é antecipada por muitos véus.

E ainda que o conhecimento seja parcial, isso não significa que desanimamos diante dele; menos ainda tornamo-nos céticos. Pelo contrário, a parcialidade do conhecimento nos instiga a ir mais fundo, a querer saber mais, a esforçar-se para fazer com que a verdade se apresente cada vez mais iluminada.

Portanto, ter a noção da parcialidade do que sabemos está longe de ser um motivo para estacionarmos, mas serve de forte inspiração para sempre quererermos conhecer mais.

Aventura do Conhecimento

Todas as formas de liberdade são discutíveis, exceto uma: a liberdade do pensar. O homem pode ser restringido em muitas coisas: em sua ação, em seu movimento e até em sua expressão, mas ninguém pode impedi-lo de pensar o que bem entende.

O pensamento é livre, por definição. Pensar é uma carreira sem margens, é um vôo pelo infinito. Para ser limitado, o pensamento precisaria ter a noção exata do que o limita, porém, se a tivesse, teria que ter também a noção do que transcende esses limites, e ter esta noção já é, de fato, transcendê-los.

Por isso, o pensamento não aceita manter-se circunscrito aos dados que já possui. Ignorante de suas fronteiras, ele sempre quer ir mais longe, seguir adiante. Assim, conhecer acaba sendo o seu impulso natural. Esse é o motivo de Aristóteles dizer que o homem tem um desejo natural pelo conhecimento. Deus o fez assim, com esse ímpeto por investigar, perscrutar, descobrir.

Está claro que o homem não foi feito apenas para gozar o mundo, já que o gozo pressupõe uma certa resignação, um deleite do que já existe. O homem foi feito para desvendar o mundo, meter-se nele, absorvê-lo gradualmente e compreendê-lo pouco a pouco.

Na verdade, Deus lançou o homem numa grande aventura e negá-la é renunciar a um aspecto fundamental do ser. Abandonar a busca pelo conhecimento, resignar-se a uma vida de mera fruição, não se empenhar por aprofundar-se no entendimento das coisas é simplesmente rejeitar uma missão divina e acomodar-se ao lado dos seres inferiores – é, de fato, viver como bicho.

Apresentação de uma Filosofia Integral

Foi uma precaução normal das escolas filosóficas, durante a história, prevenir-se de ideias consideradas perniciosas. A fragmentação da sociedade nas mais diversas correntes de pensamento, fez com que as linhas filosóficas mais puristas se protegessem daquilo que consideravam “falácias de filosofias corruptoras”. Posicionaram-se, assim, no interior das fronteiras impostas por suas próprias doutrinas, buscando, com isso, marcar bem sua linha de pensamento e manter sua coerência interna. No entanto, a quê preço? Afinal, se tem algo que não combina com a filosofia é o sentimento de abrigo e segurança proporcionado por uma doutrina qualquer.

Encerrar-se em dogmas filosóficos é problemático porque a vida não é tão clara quanto às verdadeiras fronteiras, tornando difícil saber onde a zona segura de pensamento termina e onde começa o território minado. A existência caracteriza-se por sua complexidade, que se manifesta em sutilezas e contradições. Um pensamento linear, portanto, que não se permite ziguezaguear além das margens salvaguardadas, nunca é capaz de explorar qualquer realidade fora do curso esperado do seu rio de ideias.

Quem se alberga sob conceitos inabaláveis e previamente determinados não consegue enxergar nada além do que aprendeu a reconhecer como certo. Este, quando surpreendido por um conceito inaudito, apressa-se por rechaçá-lo ou ajustá-lo para que esteja de acordo com suas próprias concepções. Não há, no caso, verdade, apenas confirmação do que já está convencido de antemão.

Ironicamente, quem mais erra não é quem se arrisca em desenvolver outros olhares, fora de sua zona de segurança teórica, mas sim quem, para manter-se coerente, se isola em caixas herméticas de pensamento. Este falha por ignorar a realidade, mantendo sua teoria inalterada; aquele acerta por se dispor a considerar a realidade antes de tudo, consertando sua teoria quando preciso.

Por isso, quando eu apresento uma filosofia que se diz integral, ofereço mais que uma teoria, mas um método, uma forma de refletir a existência, que propõe pensar a vida por perspectivas diferentes, além daquelas nas quais estamos acostumados e nos sentimos mais seguros. Na verdade, uma filosofia integral simplesmente se dispõe a aceitar a realidade como ela se apresenta, ainda que se apresente de forma inaudita.

Sou muito a favor de uma filosofia plena, que esteja aberta a se rever e a se questionar constantemente. Isso, porém, não significa que é preciso partir do zero, como uma tábula rasa, sem quaisquer convicções iniciais. Filosofar exige princípios, pois, sem eles, ficamos à deriva nesse oceano de possibilidades.

O objetivo, enfim, de uma Filosofia Integral, é capacitar o pensador a alcançar a existência em sua multiplicidade e considerar o humano em sua integralidade, não deixando, por preconceito, parcialidade ou medo, nada de fora.

Crítica Moderna à Idade Media

Nos meios intelectuais e acadêmicos é muito comum tratar a Idade Média como um período supersticioso, um tempo de rebaixamento da inteligência, de ignorância e de trevas. Chamar alguém de medieval transformou-se em um xingamento, querendo dizer que se trata de uma pessoa retrógrada, obtusa.

No entanto, apesar dos pensadores modernos – aqueles dos séculos imediatamente posteriores à Idade Média – terem sido muito críticos em relação a ela, talvez surpreenda saber que o principal conteúdo de suas críticas não era uma eventual superstição medieval mas, pelo contrário, o excesso de razão e aristotelismo que caracterizava as obras daquele período.

Os modernos viam no medievo um tempo de excessiva racionalidade teológica, de lógica árida e de abstracionismo persistente. E, de fato, tinham alguma razão em sua crítica, afinal, a Idade Média, principalmente no período final da Escolástica, caracterizou-se por debates que beiravam a inutilidade, com sutilezas impalpáveis e estéreis, como, por exemplo, a discussão se a um anjo era possível sentar na ponta de uma agulha.

O outono medieval carrega uma tradição acadêmica já muito bem estabelecida, com pensamentos elaborados e complexos, mas que, de fato, já estavam desapegados da realidade, chegando a tornar-se quase herméticos. Por isso, o Renascimento, que pode ser considerado uma pré-modernidade, representa o início de tempos nos quais as investigações começam a se preocupar com questões mais palpáveis, mais conectadas com a vida cotidiana, mais voltadas para a natureza e para o homem – é o período do humanismo.

Portanto, a crítica que os modernos fizeram aos medievais não se mostra como um desdém por aquilo que consideravam inferior, mas parecia mais com uma revolta contra a sensação de opressão sufocante causada por uma racionalidade superior. Longe de ser um levante contra as trevas da ignorância, tratou-se de um grito por liberdade em relação aos grilhões dos rigorosos raciocínios medievais.

Como a própria crítica moderna deixa claro, a Idade Média não foi um período de sacerdotes ignorantes e fanáticos, mas um tempo de razão, e de razão até em excesso.

Vocação para a Política

O cidadão comum vê os conchavos políticos como imorais. Tanto que os condena em sua vida privada, onde mentir é errado, enganar é feio, prometer e não cumprir é vergonhoso ─ tudo que é natural na política. Aí, de repente, impulsionado pelas novas tecnologias, esse mesmo cidadão passa a acreditar que pode atuar diretamente nos jogos de poder ─ os mesmos jogos onde o que mais se pratica são aquelas atitudes que ele considera antiéticas.

O que o cidadão, algumas vezes, esquece é que povo e política não costumam se misturar. A participação popular, em algum momento, pode ter algum efeito, mas não costuma passar de uma ilusão temporária. No fim, prevalece a vontade da mesma elite de sempre. Em política, até podem acontecer convulsões pontuais, mas as coisas tendem a voltar ao seu padrão histórico, que não conta com a participação do homem comum.

Política prática não é atividade para o cidadão comum porque ele não está disposto a abrir mão de suas convicções morais para se lançar nela. O mundo político é um clube fechado, que exige, como ingresso, requisitos que o cidadão comum não quer ter. E se não está disposto a tê-los, não está apto a jogar o jogo da político e, por isso, seria um contrassenso querer vencê-lo.

O fato é que ser politico é uma vocação e para ingressar nessa carreira é preciso não ter suscetibilidades afloradas para os negócios obscuros que acontecem nos corredores dos palácios. Se a pessoa fica escandalizada com o que acontece no meio político, melhor mesmo é esquecê-lo e ir para casa estudar. Até porque contribui mais para o país um cidadão consciente e conhecedor da realidade do que um político inocente incapaz de se movimentar entre os gabinetes.

Ainda que política seja importante, nem todo mundo nasceu para ela, da mesma maneira que nem todo mundo nasceu para ser artista, jogador de futebol, engenheiro, médico ou jornalista. E insistir em uma carreira para a qual não se tem inclinação é desgastante e frustrante.

Por isso, para quem não tem vocação para a politica, melhor mesmo é manter uma distância segura dela, acompanhando tudo com bastante cuidado e parcimônia.

Eficiência na Democracia

Todos aprendemos que a democracia é o melhor dos sistemas de governo. Louvamo-na como a forma ideal de se organizar a política de um país. Falar contra a democracia transforma a pessoa num anátema.

Diante disso, é natural esperarmos que um governo democrático seja, no mínimo, eficiente. Se ele está inserido no melhor sistema político que existe, é compreensível que aguardemos que suas ações sejam as melhores.

No entanto, logo percebemos que os governos democráticos se mostram, quase sempre, bastante ineficientes. Parece que, para eles, tudo é muito difícil de se realizar.

Diante dessa constatação, não é incomum praguejarmos não apenas contra o governo, mas contra a própria democracia. Alguns de nós chegam inclusive a questioná-la e a flertar com sistemas menos liberais, onde, pelo menos, o governo faz o que se propõe a fazer, sem muitos obstáculos.

O que é preciso entender, porém, é que a democracia não foi feita para ser eficiente. Pelo contrário! Sua função é ser um sistema de contenção. Isso quer dizer que ela existe para impedir a concentração de poder, diluindo-o pelas diversas instituições do Estado.

Para conter a ânsia de poder, porém, toda democracia precisa desenvolver ferramentas que, por meio de constantes ratificações e revisões, dificultem o exercício governamental. E quanto mais destas ferramentas, mais pujante a democracia é considerada.

Obviamente, ferramentas de contenção d epoder tornam o sistema democrático excessivamente burocrático e, por consequência, faz com que, nele, o governo tenha a tendência a ser ineficiente.

Na verdade, o único aspecto pelo qual uma democracia deveria ser julgada é pela liberdade que ela assegura aos seus cidadãos. Quando ela impede a concentração de poder, é isso que ela está buscando. Para tal, porém, muito do ímpeto governamental precisará ser contido e, com isso, também sua capacidade de realização.

Portanto, ao notar a ineficiência de um governo, antes de reclamar da democracia, é sempre bom relembrar que boa parte disso é proposital, como efeito da necessidade de conter o livre-arbítrio do governante. Afinal, uma democracia não foi criada para ser eficiente, mas principalmente para impedir a tirania.

Gatilhos Emocionais

Palavras machucam. A algumas pessoas, machucam mais. Em algumas delas, existem manifestações, chamadas de “gatilhos emocionais”, que despertam sensações ruins, pois trazem à tona más experiências do passado que estavam guardadas em seus inconscientes.

O fato é que qualquer pessoa está potencialmente sujeita aos maus sentimentos provocados pelos gatilhos emocionais. O problema surge quando esses mesmos sentimentos se transformam em arma de censura.

Por exemplo: hoje em dia, muitas crianças crescem sem a figura paterna. A referência ao pai pode ser um gatilho para elas. Qual, então, a solução que os experts do comportamento humano propõem? Deixar de falar dos pais, inclusive de comemorar o Dia dos Pais.

O problema é que esse é um buraco sem fundo e qualquer referência a qualquer coisa pode se tornar um gatilho, dependendo do trauma que a pessoa carrega. Ela pode ter sido mordida por um cachorro e falar desse animal pode lhe trazer péssimos sentimentos. O que fazer, então: proibir falar sobre os bichanos?

O fato é que quando qualquer coisa é censurável pelo simples fato de ser um potencial gatilho, o sentimento mais íntimo de cada pessoa acaba se tornando uma arma de coerção. Para impedir uma manifestação, basta sacar a carta do gatilho e pronto: o outro está cerceado no seu, até aqui, direito natural.

Quando o sentimento pessoal se torna instrumento de censura, o que há é a promoção do vitimismo. Sentir pena de si mesmo, ter-se como uma vítima das situações do passado, transforma-se numa arma de poder.

Se o vitimismo torna-se vantajoso, cada vez mais gente passa a fazer uso dele, o que faz dele uma cultura. Quando isso acontece, a sociedade, como um todo, enfraquece, pois ela é o reflexo dos seus cidadãos.

Por isso, se queremos uma sociedade forte, o que deve ser estimulado nas pessoas não é o vitimismo, através do oferecimento de direitos especiais para os traumas pessoais, mas a superação desses traumas, através do incentivo ao sucesso pessoal, seja material, físico ou espiritual.

Os gatilhos, de fato, devem ser anulados, todavia, não pela sua proibição, mas simplesmente fazendo deles ineficazes.

Manual Esquemático de História da Filosofia

No meu texto “Como Iniciar os Estudos da Filosofia“, eu orientei meus leitores a, antes de tudo, buscarem uma visão panorâmica da história da Filosofia, tanto em seu aspecto cronológico, como em seu aspecto temático. Por isso, agora, quero indicar um livro que pode ajudar nesse processo.

Há grandes livros de história da filosofia que nos dão uma boa noção de como a filosofia se desenvolveu, e que também analisam as ideias que foram apresentadas durante esse desenvolvimento. São poucos os livros, porém, que apresentam esse desenvolvimento de forma sucinta e didática, que permita que o leitor neófito possa fazer uma mapeamento da história da filosofia, compreendendo o que nela foi tratado, porém de uma forma rápida e simples.

Um destes é o “Manual Esquemático de História da Filosofia”, do Dr. Ives Gandra Martins Filho, publicado pela editora LTr. Nele, o autor cumpriu aquilo que está prometido no título: esquematizou a filosofia ocidental, dos pré-socráticos aos contemporâneos. Inclusive, há uma seção especialmente dedicada a filósofos brasileiros – o que torna o trabalho ainda mais interessante.

Por cada pensador que o autor passa, são apresentadas suas ideias principais, separadas com palavras-chave que indicam o que está sendo tratado. A interferência do Dr. Ives Gandra, como comentarista, é mínima, tendo ele meramente o cuidado de expor as ideias dos próprios filósofos.

Obviamente, que, se formos muito criteriosos, talvez identifiquemos algumas omissões e achemos que alguns pensadores ficaram de fora – não os principais, obviamente. Mas, de fato, seria impossível que estas omissões não existissem, se tratando de um livro que pretende fazer uma varredura de toda a história da filosofia do Ocidente. O que faltou, porém, não diminui em nada o seu valor.

Para os meus leitores, indico essa obra por ver nela uma ótima referência para quem quer ingressar no mundo da filosofia obtendo assim uma ideia geral do que ocorreu nela. Com o auxílio dos índices temáticos e alfabéticos que se encontram no final da publicação, podemos considerá-lo como daquelas que devem estar sempre à mão, para serem consultadas sempre que for preciso.