As idéias, quando na cabeça, são fluidas. Por causa do dinamismo de nossos processos mentais, costumam ser movediças, incertas, cheias de oscilações. O que mantemos no pensamento é, por isso, móvel, sempre passível de atenuações e acréscimos.

Apesar da instabilidade consequente do processo dinâmico de nossa mente, é exatamente isso que nos permite pensar muitas coisas, possibilitando a abordagem de conjunturas complexas e variáveis. Se não fosse assim, o que poderíamos conhecer seria muito pouco.

Mesmo que a riqueza da mente dependa da dinâmica de seu processo, as idéias anseiam estabelecer-se, encontrar seu lugar no mundo. Enquanto vagam na fluidez dos pensamentos, parecem adquirir um mero quase-ser, uma potência que promete assumir uma existência, mas que ainda não é.

Apenas quando exteriorizados, quando postos para fora do universo cerebral, é que os pensamentos começam a tomar uma forma mais estável. Enquanto na mente, parecem possuir apenas um querer-ser. Quando verbalizados é que assumem um compromisso com a realidade.

A verbalização estabiliza o pensamento, contudo, carrega um ônus: o comprometimento do emissor. Ninguém é criticado pelo que pensa, mas pelo pensamento que expõe. Verbalizar é também assumir uma responsabilidade com o que se diz. Palavras emitidas ganham identidade. Não são mais idéias livres, descompromissadas, como quando estão apenas na mente. Agora, são as idéias de alguém; idéias que identificam a pessoa.

De qualquer forma, a verbalização, quando é meramente oral, ainda retém algum privilégio de provisoriedade, pois o que é falado pode ser posto na conta do momento, da má escolha, da emoção. A linguagem falada nunca é definitiva. É sempre uma intenção, um direcionamento, um desejo.

Apenas a palavra escrita assume a condição de verdadeira estabilidade. O escrito pressupõe a devida reflexão, a possibilidade de revisão antes de sua exposição, a certeza do que se quer dizer. Quem escreve teve tempo de pensar e sabe que está assumindo um compromisso com que está disponibilizando para ser lido. O escritor sabe que a desculpa do instante, da paixão, da pressa e da leviandade não lhe cabem.

Escrever é, no fim das contas, expor-se definitivamente; é um caminho sem volta. A escrita é a materialização do pensamento e a solidificação das idéias. Quem escreve se abre, se oferece para a crítica, se desnuda para o mundo. Por isso, escrever é um ato de coragem – quando não, de pura imprudência.