Há uma coisa que é pior do que a condenação à morte; é a condenação à imortalidade terrena. E o que a internet e as redes sociais nos proporcionam é isso. O que é dito hoje, ficará, de alguma maneira, para sempre. Em tempos atrás, nossos erros, vacilos e até crimes poderiam ser, facilmente, esquecidos ou se mantinham vivos apenas na memória de alguns ou eram sabidos somente daqueles que buscassem oficialmente essas informações. Hoje, qualquer palavra proferida pode perseguir seu autor perpetuamente.

Por isso, um erro cometido hoje pode ser como a pedra de Sísimo, devendo ser carregada até o fim da vida. Além disso, tais equívocos, por conta de ficarem arquivados nos bancos de dados da rede, acabam sobrevivendo, inclusive, à nossa própria matéria, ao nosso corpo. São marcas indeléveis que nos acompanham e nos superam.

Para um homem já considerado old school, como eu, isso tem algo de aterrorizante. Em minha juventude, uma das coisas que eu mais prezava era o meu direito a ser esquecido, meu direito ao anonimato. Agora, até espontaneamente, nos lançamos ao mundo e nos expomos escancaradamente. E o pior, arriscamos dizer coisas que ficarão gravadas para sempre, acessíveis a qualquer um por alguns poucos cliques no computador.

Não era incomum, quando a vida em um local tornava-se insuportável, por causa dos pecados cometidos, o homem se mudar para uma outra cidade, uma outra vila, onde ninguém sabia o seu passado, onde ninguém o conhecia. Até isso está sendo retirado de nós. Onde quer que nós formos, nosso passado nos perseguirá implacavelmente, estando à disposição de qualquer curioso que queira espreitar nossos antigos tropeços.

É óbvio que temos a opção por viver nas sombras, fora de onde quase tudo acontece hoje em dia, que é a internet. Claro que podemos, simplesmente, passar incólumes, não emitindo opiniões, não falando nada, sendo um mero espectador de tudo que o passa. No entanto, pessoas, como eu, têm a necessidade incontrolável de escrever, de participar da vida cultural, de emitir pareceres sobre tudo o vier à mente. E o mundo precisa desses para seguir em frente.

Portanto, por mais assustador que seja tudo isso, por mais que a internet nos eleve a um patamar até superior ao que podemos suportar, já não conseguimos nos imaginar vivendo como antes, quando cada um tinha apenas voz em seu círculo e o que dizia não alcançava mais que algumas pessoas.

Agora alcançamos uma imortalidade maldita e não queremos abrir mão dela, de maneira alguma.