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Necessidade de Arrependimento

As pessoas têm muito medo de arrepender-se de suas escolhas, apesar de reiteradamente tomarem decisões equivocadas em suas vidas. Ainda assim, poucas reconhecem que se arrependem. Parece até que o arrependimento representa algum tipo de condenação.

Há uma cultura que rechaça o arrependimento e isso conduz a uma ilusão de que é possível viver sem ele. O problema é que uma vida sem arrependimentos não permite a autoavaliação, e quem não avalia a si mesmo não se corrige, ficando sujeito a cometer os mesmos erros de sempre.

No entanto, arrepender-se é algo absolutamente natural. A pessoa pode negar que o faz, mas não há ninguém que, se tivesse a chance, não mudaria alguma ação, fala ou omissão que cometeu.

O problema é que, em nossos tempos, o arrependimento é visto como sinal de fraqueza, insucesso ou mesmo resquício de uma superstição religiosa. Ele tornou-se algo vergonhoso. Por isso, todos tentam escondê-lo.

Por causa disso, o arrependimento tem sido sufocado, reprimido e racionalizado por esta geração, o que torna-a neurótica, obviamente. Melhor seria que ela não o evitasse, mas o aceitasse como uma reação espontânea de qualquer pessoa que tenha um mínimo de consciência.

Por isso, ninguém deveria fugir do arrependimento, mas aproveitá-lo para se tornar alguém melhor. Ninguém deveria negá-lo, nem fingir que aprova tudo o que fez na vida, mas usá-lo para promover as reformas pessoais necessárias.

Se o arrependimento, quando não usado para promover a melhora do indivíduo, pode ser considerado inútil, ao tornar-se instrumento para o crescimento pessoal se transforma em uma verdadeira via para sua salvação.

Somos o que pensamos

Se há uma determinação bíblica para o arrependimento, para a conversão, para a escolha em favor de uma vida virtuosa, de uma vida com fé, isso significa que há, dentro de cada pessoa, a capacidade de decidir seu destino. Portanto, pode-se dizer que o que somos, e o que nos tornamos, é, de alguma maneira, fruto das escolhas que fazemos. E nestas escolhas se encontram, não apenas as atitudes a serem tomadas, as decisões práticas da vida, como a profissão que devo escolher, com quem devo casar ou qual igreja frequentar, mas (e, talvez, principalmente) os conteúdos que serão assimilados no decorrer da existência e que, certamente, irão moldar a forma de pensar, a própria visão das coisas e do mundo.

Por isso, a importância de não ser um personagem passivo na relação com aquilo que será absorvido durante a vida. A pessoa não pode, simplesmente, deixar com que os conteúdos venham até ela, sem qualquer critério, sem que haja uma seleção, sem refletir sobre a conveniência, sobre a utilidade do que está absorvendo. Se o indivíduo é o responsável por sua vida, então essa responsabilidade inclui também aquilo que ele consome e que irá, certamente, refletir em seu próprio caráter.

É por isso que o apóstolo Paulo, em sua carta à Igreja em Filipos (Fp 4.8), aconselha as pessoas a pensar naquilo que é verdadeiro, honesto, puro, amável e de boa fama. Ele insiste que nestas coisas elas devem meditar, nelas devem refletir. E esta não é uma mera determinação moral, mas um aconselhamento prático que, acatado ou não, aí, sim, trará consequências morais óbvias, apesar de diferidas.

Isso porque o que nós pensamos acaba sendo, de alguma maneira, aquilo que nós somos. E o que se encontra nas palavras de Paulo é o reconhecimento de como aquilo que nós absorvemos e recolhemos dentro da nossa mente acaba sendo o que irá definir quem nós seremos.

Nisto, fica evidente a seriedade da escolha que fazemos em relação aquilo que lemos, ouvimos e vemos. E também, obviamente, daquilo que deixamos de ler, ver e ouvir. Porque algumas pessoas acabam acreditando que, se o que absorvemos pode nos prejudicar, é melhor não absorver nada. Grande erro!

O problema é que não assimilar nenhum conteúdo é impossível. Quem não seleciona o que consome, o que absorve, se torna um sujeito passivo, assimilando, ainda que de maneira inconsciente, tudo o que aparece em sua frente. Não há como se fechar às influências externas, para os dados com os quais se deparam cotidianamente. O máximo que se pode alcançar é tornar-se consciente desse processo e tentar separar o que deve ser absorvido daquilo que deve ser rejeitado.

O preceito bíblico aqui trata exatamente dessa capacidade humana de escolher o que pode ser bom e útil, e rejeitar o que é prejudicial. É importante frisar que o texto não trata apenas de rejeição, mas de escolhas. O que o apóstolo aconselha é que as pessoas pensem naquilo que eleva, que conduz a uma vida superior, que aproxima da verdade e de Deus.

No fim das contas, a Bíblia está afirmando que o homem se transforma naquilo que ele pensa. Se pensa em coisas boas e superiores, vai se tornar alguém elevado e superior. Porém, quem enche a cabeça de lixo, não tenha dúvida alguma, que é em lixo que irá se transformar.

 

O arrependimento de Judas

Uma das inúmeras vantagens que a fé em Cristo nos permite sobre a vida ordinária é a possibilidade constante de arrependimento. Mas tal diferença não se encontra no arrependimento em si, apenas. O homem comum, mesmo que não tenha fé, pode arrepender-se de atos cometidos e palavras proferidas. Pode ser que, ao refletir sobre sua atitude, ele perceba que agiu mal, injustamente, erroneamente e, de alguma maneira, diga: “Se pudesse, voltaria atrás em meus atos”.

O fato, porém, inexorável, é que o tempo não volta. O que foi feito, está feito; o que está dito, está dito; o que está escrito (ainda mais nestes tempos que não é mais possível rasgar os papéis), está escrito.

Para o homem sem fé, porém, a impossibilidade de apagar o passado, reescrever sua história, retomar sua vida a partir do momento antes do erro é um peso que pode se tornar insuportável. Saber que seus equívocos estarão lhe perseguindo pelo resto da vida pode ser uma opressão demasiado forte para poder ser tolerada.

Quando diz-se que Judas Iscariotes cometeu suicídio não por ter se arrependido, mas por remorso, tal assertiva é quase correta. Na verdade, Judas arrependeu-se, pois percebeu, segundo suas próprias palavras, que pecou, “traindo sangue inocente” (Mt 27.4). O que não havia nele era a fé. Por isso, seu arrependimento, ao invés de libertá-lo, acabou por consumi-lo.

O que faltou a Iscariotes, e que todo cristão verdadeiro possui, por causa de sua fé em Cristo, é a possibilidade de lançar sobre ele seus arrependimentos, sabendo que “se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça” (IJo 1.9).

Essa possibilidade traz para o cristão, além da óbvia vantagem espiritual, uma evidente vantagem psicológica. Saber que seus pecados são perdoados pelo ser mais poderoso que há, anula toda e qualquer acusação que pode ser feita por um ser humano qualquer. Além disso, ter a certeza que Deus, que é o juiz soberano, não considera mais seus erros, pois os perdoou, é uma fonte de motivação para recomeçar e tentar mudar a própria história.

Às vezes, algumas pessoas ficam incomodadas com criminosos que, após serem encarcerados, se convertem ao cristianismo. Para o homem comum, isso, simplesmente, é uma forma de tentar limpar seu passado sujo e pecaminoso.

Na verdade, esses que se incomodam estão certos por um lado, pois um criminoso, quando se converte, está tentando mesmo, de alguma maneira, apagar a nódoa do seu passado. Porém, os que o criticam não percebem que é esta mesma a essência do cristianismo e a vantagem do cristão. Se o passado, como fatos que ocorreram no tempo e tiveram suas consequências, não pode ser mudado, resta para aquele que errou e se arrependeu apenas dois caminhos: ou lava seus erros com o sangue de Cristo, ou sufoca-se em seu próprio remorso.

Por isso, ser cristão é uma possibilidade constante de retomar a vida. Mesmo quando alguns erros parecem tê-la condenado definitivamente, o crente pode confiar que, diante daquele que mais importa, seu passado equivocado está apagado. E se não está da memória, da crítica humana e das consequências temporais, ao menos está anulado no que é mais importante: na separação que ele faz entre o homem e Deus.