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A Essência da Democracia

Burocratas enfadonhos, políticos de índole suspeita e juízes autoritários defenderem a democracia com ardor e, em alguns casos, quase aos prantos, não passa de um teatro cômico, que se não nos faz rir é porque entendemos a tragédia que se encontra por detrás de todo esse histrionismo.

Manifestações grandiloquentes e apaixonadas, comumente apenas oferecidas aos deuses, a favor de uma mera forma de governo poderiam fazer-nos jurar que essa tal democracia se trata de um sistema perfeito, ofertado diretamente pelos céus, oriundo de uma mente superior.

Se há aqueles que exaltam a democracia com efusividade é porque têm a impressão de que ela existe para defender os valores da liberdade, da legalidade, da diversidade e da igualdade. Todavia, a democracia é tão empolgante quanto um emprego num cartório. Aliás, ela transforma mesmo o país em um grande tabelião, burocratizando tudo e impedindo, exatamente em defesa daqueles valores, que os poderes sejam eficientes e independentes. 

Inclusive, esqueçamos aquela ideia pueril da democracia como o governo da maioria. É fato que nela há representantes eleitos, mas esse é apenas um mecanismo marginal de seu funcionamento. A essência do que a caracteriza está na forma como os poderes estabelecidos se relacionam. Nela, nenhum deles deve ter força absoluta. Todos precisam ser refreados, impedindo-se assim que seus atos tenham aplicação imediata e incontestável. 

Os teóricos preferem chamar isso de harmonia entre os poderes, mas só posso concordar com eles se considerarmos que a fiscalização, o refreamento e o impedimento mútuos possam ser considerados expressões harmônicas de convivência.

Democracia nada mais é do que um conjunto de ferramentas disponíveis para tornar mais difícil qualquer ação política, pressupondo que o melhor é criar barreiras para evitar a centralização do poder do que arriscar submeter a sociedade a um tirano. Ela prefere à eficiência a segurança, entendendo que os males de um governo lento e burocrático são menores do que os de um governo ágil, mas possivelmente mau. 

A democracia nada mais é do que o sistema da desconfiança. Não dá para se empolgar com algo assim tão restritivo. Posso preferi-lo, mas sem euforia. No fim das contas, concluímos que a democracia é simplesmente a escolha pelo mal menor diante dos riscos que as outras formas de governo representam. Ninguém pode, portanto, sentir-se tão empolgado em sua defesa e se alguém parece estar certamente será por fingimento.

A democracia como eles a entendem

Causa confusão ver petistas falando em defesa da democracia quando sabemos que as atitudes do partido, há muito, já provaram que esse modelo de governo não é o seu preferido. Ainda assim, parece que há até uma certa obsessão no uso dessa palavra, principalmente se for para acusar os adversários de atentarem contra ela, como se aqueles que a proferem – no caso,  petistas – fossem seus verdadeiros guardiões.

Petistas são marxistas-leninistas e estes, historicamente, nunca foram muito afeiçoados à democracia. 

Então, por que insistem em referir-se a ela como se fosse seu baluarte? É que democracia, na concepção marxista, está longe de ser a ideia, que a maioria das pessoas possuem, de um governo de todos. Para os marxistas, existe apenas a democracia do partido. Na época da revolução bolchevique, isso incluía todos aqueles que participassem ativa e favoravelmente da revolução, de líderes partidários a proletários – se bem que gradual e rapidamente estes últimos foram perdendo voz dentro do movimento, até ele se transformar em uma verdadeira ditadura, com Stalin. Hoje, o conceito permanece o mesmo, ainda que os personagens tenham sido adaptados. Agora, não são os proletários, mas os grupos de apoio, como os coletivos de minorias e as ongs afiliadas, a participarem dessa democracia partidária.

Logo, para o petista, democracia significa nada mais do que o direito dos membros ligados ao partido e aos grupos de apoiadores participarem das deliberações em relação às ações e direcionamentos políticos a serem tomados. A democracia como eles entendem é apenas interna – e, ainda assim, geralmente teórica e aparente. Dessa maneira, quem não colabora com o partido, quem não concorda com sua política e mesmo quem é indiferente a ele está fora dessa concepção democrática. Democracia, para petistas, significa meramente o modelo de ditadura coletiva a ser implantada.

Com isso, fica mais fácil entender as palavras de Jacques Wagner, coordenador da campanha do Partido dos Trabalhadores, que afirmou que o problema, para eles, era ter que “jogar o jogo com as regras deles” – referindo-se obviamente aos sistema democrático-eleitoral brasileiro. Também esclarece muito sobre a afirmação do candidato petista derrotado na corrida presidencial, Fernando Haddad, quando ele diz, em seu discurso, sobre uma “DEMOCRACIA COMO NÓS A ENTENDEMOS”. Nesta, você, que não concorda com ele, nem com as ideias esquerdistas, está fora, sem direito a dar qualquer palpite nos rumos do país.

Por isso, todos nós, que não concordamos com eles, somos, para eles, uma ameaça à democracia. Porém, ressalte-se: à democracia como eles a entendem.

Sobre a necessidade dos debates eleitorais

Não há pior maneira de entender o pensamento de alguém senão por meio de um debate. Quem já assistiu algum destes sabe muito bem que, geralmente, não passam de algumas horas enfadonhas de tentativas, quase sempre infrutíferas, de marcar presença, seja com uma frase de efeito, um pensamento memorável, uma piadinha bem colocada ou uma intervenção pontual marcante. O que os debates conseguem oferecer são, no máximo, alguns poucos momentos a ser recordados e muitos outros completamente dispensáveis.

O fato é que debates, quase sempre, são inúteis. Se o objetivo, como costuma se alegar, é conhecer melhor as propostas dos candidatos e entender mais profundamente seus planos de governo, o debate é o pior modelo possível a ser escolhido.

Isso porque em debates o que prevalece é o jogo retórico. As partes disputantes têm como objetivo primeiro a vitória, por consequência, a imposição da derrota do adversário. E quando alguém busca a vitória, não é a exposição detalhada de si mesmo(de seus pensamentos e planos) que aparecerá, mas atalhos retóricos que sirvam para desmoralizar ou desqualificar o oponente.

O que se forma em um ambiente de debate é a disputa, uma guerra retórica. E nesse clima não há espaço para o detalhamento de nada. São apenas acusações, perguntas com o intuito de confundir, frases de efeito e muita, muita enrolação, com números, estatísticas e dados que não dizem nada – mas servem muito bem para esconder os assuntos de fundo.

Além disso, o formato proposto nos debates atuais não permite qualquer tipo de aprofundamento. O tempo é exíguo e não há espaço para a apresentação de nada além de ideias gerais.

Por isso, insistir que os debates são essenciais para o processo democrático é pura balela. Pelo contrário, comparado com as formas de comunicação existentes hoje em dia, esses debates são completamente dispensáveis. São apenas resquícios de um tempo antigo, quando a tv era a única forma de comunicação em massa.

Com a internet, na verdade, não há mais nenhuma necessidade que candidatos se enfrentem no modelo de debates como foram feitos nos últimos trinta anos. Hoje, esses candidatos têm a oportunidade de falar diretamente com o público – sem filtros e sem pegadinhas. Além disso, podem explorar os assuntos a ser expostos sem qualquer restrição de tempo.

Essas formas novas de comunicação são, no fim das contas, o sonho democrático. Aquilo que era feito na ágora, com a elite pensante grega, que passou a ser replicado nas câmaras de representantes desde a Roma Antiga até os nossos dias, agora, de alguma maneira, pode envolver todo mundo. Se esse é o ideal da democracia, ou seja, um governo com a participação de todos, então a internet é o instrumento que permite isso.

Quem diz, portanto, que os debates de tv são essenciais para a democracia ainda não entendeu – ou finge não entender – que os tempos mudaram. Agora, nós, o povo, não precisamos mais de intermediários para ter acesso aos nossos representantes. Não é preciso mais editores, âncoras e mediadores para levar até eles nossas perguntas. Também não precisamos mais de empresas de mídia para nos mostrarem esses políticos. 

Agora, que eles venham até nós. Que eles aprendam a falar conosco diretamente. E que nós os julguemos segundo a verdade que eles nos transmitam. Se todos os lados precisam aprender a usar esses novos instrumentos de maneira plena é outra questão.

O fato é que vivemos um novo tempo para a  comunicação política e quem não se adaptar a ele, certamente, morrerá.