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Excesso de Vozes nas Redes Sociais

As redes sociais nos têm feito muito mal. Nossa estrutura humana – psíquica e física – não é capaz de processar tantas informações, principalmente da maneira desenfreada como as consumimos. É um verdadeiro ataque silencioso ao nosso espírito.

Tenho plena convicção de que muito da depressão, pensamentos suicidas, sensação de falta de sentido e um desânimo mórbido são consequências dessa exposição inconsequente.

O ser humano sempre absorveu uma quantidade limitada de dados. Mesmo com os meios de comunicação em massa, quando houve um aumento exponencial das informações, nada se compara ao que temos hoje. Somos bombardeados pelos conteúdos mais diversificados, que se alternam em segundos. Abarrotamos nossa alma com todo tipo de ideias, pensamentos, conselhos, notícias, estudos, informações, piadas, imagens e sensações.

Tudo a que nos expomos, querendo ou não, ingressa em nosso espírito. Independentemente da qualidade desses conteúdos, nosso cérebro tentará processar essas informações, ainda que nada faça sentido para ele. Claro que essa tarefa lhe é hercúlea. Como consequência, pensamentos e sentimentos afluirão anarquicamente de dentro de nós, sem que sequer percebamos.

Nós não temos controle de tudo o que absorvemos. Em geral, somos meros pacientes nesse processo, colaborando muito pouco com ele. Como nossa mente vai processar tudo acaba sendo uma incógnita. Pode ser que crie sínteses criativas e inteligentes, ou gere neuroses, ideias negativas, ilusões esquizóides e obsessões. Por isso, tenho convicção que muito dos sentimentos e pensamentos negativos que brotam de dentro de nós são fruto dessa relação irresponsável com as redes sociais.

Pouca gente irá falar sobre isso, porque muitas delas ganham muito com essa dependência que as redes sociais provocam. Mesmo assim, não sou contra seu uso, pois reconheço as possbilidades que oferecem. Apenas proponho a ponderação em relação ao seu consumo, lembrando sempre de que não nos há nada mais caro do que a nossa sanidade.

Agitação e Interioridade

Quem já teve dificuldade para dormir, por causa de algum problema que estava passando, tendo ficado com os olhos abertos, enquanto os pensamentos cavalgavam selvagemente dentro de si, entende bem o que quer dizer “conseguir colocar a cabeça no travesseiro”.

Nessa sentença popular, está embutida uma verdade universal: o quanto à noite, e o seu silêncio, pode trazer à tona os fantasmas interiores. É naquele momento, que deveria se de paz e descanso, que os elementos da fantasia (os fantasmas) resolvem aparecer e aterrorizar.

Esses fantasmas se aproveitam da ausência de dispersões, da falta de imagens, sons e sensações, que, durante o dia, ocupam espaço na mente das pessoas, e assombram-nas, perturbando a tranquilidade delas.

Depois que o cansaço vence o terror e o sono vem, a manhã surge como um alívio. Na verdade, os sons do dia e a movimentação do cotidiano acabam servindo como refúgio, que afasta aqueles provocadores noturnos.

Eu nunca entendi muito bem o gosto pela algazarra e pela multidão. No entanto, essa preferência pode ser explicada pelo fato da agitação sobrepor a interioridade. O barulho e toda a ebulição diária faz sair de si mesmo – de onde habitam os fantasmas – e permite seguir em paz, entretido com todo o passatempo costumeiro.

O burburinho do dia-a-dia serve para aplacar a consciência e possibilita viver o sossego da irreflexão.

Assim, se existe uma atração pela balbúrdia e pela aglomeração, nada explica melhor esse gosto do que a necessidade de exilar-se de si mesmo.

Ler não é um prazer

É tão bonita a imagem, que tanto se vê pintada em quadros, da pessoa lendo um livro, sentada gostosamente em uma poltrona, geralmente ao lado de uma lareira, com aquele aspecto sereno, pacífico, em um instante de tranquilidade e descanso.

Quem não costuma ler, ou lê apenas trivialidades, talvez acredite que essa descrição reflita a realidade. Mas quem realmente tem o hábito da leitura, principalmente de obras mais densas – que são aquelas realmente relevantes – sabe que não é a calma e o sossego que caracterizam esse momento.

Minhas ocasiões de leituras não costumam ser nada pacíficas. Para um observador externo, que me veja absorto, como que navegando sobre as palavras de um escritor, talvez pareça que se trata de alguém em uma ocasião de quietude e amenidade. Mal sabe ele que, na verdade, o que está ocorrendo ali é uma autêntica batalha. 

Todo leitor enfrenta muitas adversidades. A primeira delas é a desatenção. A natureza humana tende à dispersão, e para manter-se consciente em cada frase, em cada parágrafo, retendo a relação entre as ideias, é preciso concentração. Mas não existe concentração sem luta. O leitor que relaxa se perde; o que descansa se distrai. Por isso, não há de se falar, ao se referir à leitura, a um momento de repouso. Não, ele não é! Ler é sempre trabalhoso.

Não bastasse a energia despendida para a compreensão do que se está lendo, há ainda a necessidade de retenção do que se leu. Mas nossa memória é fugidia e, quando não forçosamente treinada, deixa escapar muita coisa. Por isso, o que torna a leitura mais extenuante nem é entender o conteúdo, mas manter na memória as ideias lidas. Sem essa retenção, a relação entre os pensamentos é quebrada e o sentido geral se perde. A absorção do conteúdo exige firmeza do leitor e não permite que ele relaxe, tornando a leitura um inescapável combate consigo mesmo.

Mas toda a dedicação para manter-se concentrado e reter o que se leu seria em vão se o leitor não se empenhasse em ir além da compreensão das ideias do escritor e tentasse pensar como ele. Ler apenas como receptor da mensagem, sem colocar-se no lugar do autor da obra, buscando repetir sua experiência e até replicar seu espírito, é praticar uma leitura parcial. Porém, esse exercício de reprodução da experiência mental do escritor exige uma entrega à leitura, que só é possível com uma disposição de alma que será certamente desgastante e cansativa. Quem, sabendo disso, ainda acredita que ler é uma atividade relaxante, não compreendeu nada do que se está tratando aqui.

Ler jamais será prazeroso. Pelo menos, não no sentido de prazer como aquela sensação agradável relacionada à satisfação de um desejo. Se há algum prazer na leitura, pode-se falar de um prazer diferido, que não é aquela sensação boa concomitante ao gozo da atividade, mas o resultado do sentimento de realização adquirido pela conquista do conhecimento.