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O Que Caracteriza a Dialética Marxista

Sobre dialética, é muito comum referir-se a ela como sinônimo de debate. Nos meios intelectualizados, costuma-se dizer que as partes mantêm uma dialética quando se quer exprimir simplesmente que elas estão discutindo algum assunto. Junto a isso há uma crença estabelecida de que essas discussões “dialéticas” sempre trazem algum bom resultado. Acredita-se que o simples fato de haver discussão levar-se-á a um produto melhor. Inclusive, há uma certa veneração ao debate como necessário à evolução das coisas.

A dialética tornou-se essencial à visão de mundo dos marxistas exatamente porque, segundo o conceito que defendem, ela definiria o processo de desenvolvimento de tudo. Compreendê-la, portanto, significa penetrar no âmago do pensamento esquerdista.

Antes, porém, dos progressistas adotarem a dialética como base de sua concepção da realidade, já havia mais de mil anos de conhecimento sobre ela. Desde os antigos filósofos gregos fala-se de dialética. Mas seria ela a mesma apregoada pelos marxistas?

Alguns estudiosos acreditam que a dialética fora concebida por Parmênides, outros dizem que fora Zenão, outros ainda a atribuem a Heródoto. No entanto, seu formato, como o herdamos, ficou estabelecido em Sócrates e depois categorizado por Aristóteles.

Sócrates, ao desenvolver seus pensamentos, costumava usar o diálogo. O que ele fazia, de fato, era propor algumas perguntas e afirmações e suscitar no interlocutor algum tipo de manifestação, que podia ser desde a mera concordância ou (o que Sócrates adorava!) alguma contestação. Com as ideias postas, ele buscava fazer as inferências necessárias delas, esclarecendo cada vez mais o tema proposto. Por exemplo, ele perguntava: “O que é a justiça?”, então, levantava algumas hipóteses, estabelecia quais eram certas e, a partir delas, por indução, ia conduzindo o raciocínio. As ideias não precisavam, necessariamente, entrar em conflito. Às vezes, elas estavam de acordo, às vezes se completavam e, outras vezes, se opunham. Vê-se, portanto, que o conflito não era a regra.

Mais do que um debate entre pessoas, a dialética era uma confrontação (não necessariamente no sentido conflitivo) de ideias. Tanto que é bem possível fazer um movimento dialético sem um interlocutor real, dentro da própria mente do proponente. As ideias diante umas das outras é o que importava, não as pessoas. É como se elas fossem colocadas sobre a mesa para que se decidisse quais seriam descartadas, quais aproveitadas e quais consertadas. As que sobrevivessem tornavam-se premissas para a sequência dos raciocínios.

Os raciocínios dialéticos, apesar de obedecerem o método da inferência, não criavam nenhuma nova realidade. Pelo contrário, o inferido tinha o caráter de esclarecimento, ou seja, de revelação da verdade, daquilo que ainda não estava claro, que estava oculto.

Aristóteles deu o caráter definitivo à dialética ao identificá-la à busca da verdade. O que ele estava propondo é que nela haveria uma insinuação de ideias em torno da verdade, como se dançassem ao redor dela. Sendo assim, é um requisito da dialética aristotélica que as partes estejam de boa vontade no processo. Se houver, entre elas, um intuito conflitivo, um desejo de impor a própria opinião, a dialética fica prejudicada, já que não haverá aquele movimento benevolente em busca do conhecimento.

A dialética grega, com efeito, não era um processo criativo, mas revelatório; um método para fazer surgir a verdade, ou seja, fazer aparecer uma realidade já existente. Por isso, diz-se que tanto em Platão como em Aristóteles ela era um processo de esclarecimento.

A mudança do conceito da perspectiva sobre a dialética vai ocorrer com Hegel. Nele, ela se transforma não em uma via para o esclarecimento, mas em um processo de desenvolvimento da própria realidade. O que era um movimento centrípeto, em direção à verdade, transforma-se em centrífugo, de criação de novas realidades.

A dialética hegeliana pressupõe que toda ideia possui, em si mesma, uma contradição. Esta contradição gera um conflito, o qual terá como resultado uma nova ideia superior à anterior. Esta nova ideia já nasce com sua contradição, que gera um outro conflito, que gera uma nova ideia e assim indefinidamente. Tem-se, com isso, um processo espiralado e ascendente. Assim, há, na concepção dialética hegeliana, um evidente conteúdo progressista, apesar de conter também um elemento conservador. Isso porque, ao mesmo tempo que ela indica uma evolução constante, também considera que as verdades superadas pelo novo não são descartadas, mas nele absorvidas. O que, porém, a diferencia da dialética grega é seu caráter criativo. Se, para os gregos, ela revela a verdade, para Hegel gera realidades.

Hegel criou uma legião de seguidores. Na verdade, na Alemanha do século XIX, todos os jovens instruídos eram hegelianos. Karl Marx era mais um entre eles e assumiu a dialética hegeliana como a explicação do processo de desenvolvimento da realidade. Porém, o fator distintivo de sua visão do processo dialético, herdado de outro hegeliano, Feuerbach, foi sua materialização. Para Marx, que entendia que tudo era matéria, a dialética constituía o processo de desenvolvimento de tudo, inclusive da história, da sociedade e da economia.

O que vai diferenciar o processo dialético marxista do hegeliano, além de sua aplicação ao mundo material, é o seu caráter essencialmente revolucionário. A dialética, dentro da tradição marxista, acabou se estabelecendo como um processo gerador de novas realidades, mas, diferente de Hegel, e mesmo de Feuerbach, o caráter de preservação é abandonado e estabelece-se que o novo gerado descarta o velho superado. Os filósofos ortodoxos comunistas vão afirmar que o antigo fica caduco e é totalmente deixado para trás.

É verdade que os marxistas mais intelectualizados vão sempre tentar resgatar a dialética à maneira hegeliana, tentando manter parte de seu caráter conservador. No entanto, a visão mais dogmática marxista vai ser radical em tê-lo como um processo revolucionário, ou seja, como superação total do passado.

O fato é que a dialética marxista é essencialmente revolucionária e, acima de tudo, uma concepção da realidade que molda a visão que os progressistas têm sobre todas as coisas, afinal, para eles, ela está em tudo e explica a evolução de tudo. Portanto, quem quiser compreender uma mente progressista precisa entender o papel que a dialética tem na formação de sua inteligência.

Mal-Estar pela Influência Marxista

Poucas pessoas têm noção do quanto o marxismo influencia o pensamento contemporâneo. Elas aprenderam a falar de doutrinação e de assédio intelectual, mas pouco se dão conta de que o marxismo moldou a mentalidade atual, tornando-se a cultura dominante dos nossos tempos.

Ter consciência disso foi a minha motivação para escrever o livro ‘As Origens do Mal – A Filosofia Marxista e como Ela Transformou o Mundo’. Saber que o marxismo formatava a forma de pensar das pessoas motivou-me a tentar abrir os olhos delas, mostrando, em detalhes, como suas mentes estão afetadas por essa ideologia.

Sem ler o livro, tem gente que vai achar que é um exagero dizer que o marxismo forjou a cultura destes dias. Ninguém nega sua influência, mas muitos tendem a minimizá-la, como se fosse algo pontual.

A dificuldade de enxergar o domínio marxista deve-se ao simples fato de ainda persistirem resquícios da cultura anterior, que é essencialmente cristã, nas instituições e tradições sobreviventes. Isso cria uma ilusão de que essas formas anteriores são predominantes.

Quando olhamos nossas instituições, de longe elas parecem as mesmas de sempre, porém, quando nos aproximamos delas na realidade, já percebemos que foram tomadas pelo pensamento marxista. Não há uma delas que tenha saído incólume dessa invasão.

O sucesso do aparelhamento marxista deve-se à natureza do marxismo, que longe de ser – como muitos pensam – uma mera proposta econômico-social, trata-se de uma filosofia e de uma visão de mundo. O marxismo tomou a cultura como as religiões fizeram no passado, transformando não apenas as instituições sociais, mas oferecendo novas categorias de pensamento e, por consequência, de percepção.

A experiência que os leitores do meu livro têm relatado, porém, é dúbia: se, por um lado, dizem que é esclarecedora, por outro, sentem um certo mal-estar, por perceber o quanto eles mesmos estão contaminados. Como um aluno relatou-me: é como se estivéssemos mergulhados num piche e, com a leitura, conseguíssemos levantar para respirar, mas ainda sujos.

A percepção da sujeira é tanto mais forte quanto a pessoa a reconhece e deseja limpar-se. Se meu livro causa essa sensação de sujeira, então, parece-me que ele está conseguindo atingir o seu objetivo.

Faculdade de Marxismo

Não costumo ver comunistas debaixo da cama, mas cansei de vê-los nas salas de aula. Aliás, se a maioria das universidades do Brasil mudasse o nome de seus cursos para Faculdade de Marxismo, não seria exagero algum. É triste saber que isso é verdade, mas o marxismo tomou conta da Academia brasileira, e os mestres já nem mais fazem questão de esconder esse fato.

Obviamente, sempre há aqueles que negam as consequências disso, dizendo que a universidade é um espaço plural e o marxismo é apenas uma entre tantas idéias lá presentes. Isso até poderia ser verdade se o marxismo fosse tratado, nela, apenas como mais uma idéia. Nem seria tão problemático se se referissem ao marxismo como uma mera proposta econômica ou social. No entanto, o marxismo foi absorvido no meio acadêmico como ciência. Mas não como uma ciência qualquer e sim como uma ciência fundamental e, por isso, tomou conta de tudo.

E isso não é nenhum exagero. Por exemplo, na área que eu empreendo meus estudos, da linguagem, o marxismo é considerado uma disciplina basilar. Eni Orlandi, por exemplo, uma das maiores especialistas em Análise de Discurso, expõe isso textualmente em seu livro, ao afirmar que essa matéria baseia-se em três disciplinas: Linguística, Psicanálise e Marxismo. Portanto, colocando o marxismo como alicerce para outra ciência.

E isso ocorre em praticamente em todas as outras disciplinas. Em Psicologia, Pedagogia, Literatura, Direito e mesmo naquelas disciplinas mais técnicas, como Arquitetura e Biologia, Karl Marx não apenas é constantemente citado, como os próprios principais autores são todos confessadamente marxistas e possuem uma concepção de mundo marxista.

O problema é que o marxismo é uma visão muito parcial da realidade. Cheio de equívocos e artificalismos, criou-se em volta dele uma aura científica que é falsa. Praticamente, todas suas concepções são uma criação posterior construída para justificar uma ideologia. Confesso que considero o marxismo algo bem criativo, no entanto, está longe de refletir a realidade.

Mais ainda, o marxismo não possui, em suas origens, o mínimo que se exige de uma ciência para ser considerada como tal. Na verdade, ele é somente uma especulação, senão uma mera teoria imaginativa, bastante inventiva, de fato, mas que pouco tem a ver com a realidade. Como diz Viktor Frankl, marxismo é uma abordagem específica de determinadas ciências, não uma ciência em si mesma.

Sendo assim, muito menos pode servir de base para qualquer outra ciência. A não ser que se confesse que os cientistas têm como base de suas investigações uma mera ideologia, com uma visão parcial dos fatos. O que, obviamente, eles nunca farão.

Boa parte dos acadêmicos que lerem este texto certamente irão estrebuchar. Dirão que eu não entendo o que é o marxismo ou que não compreendo a relação dele com as disciplinas acadêmicas. Isto já é esperado e, no meu entender, será suficiente para corroborar tudo o que eu estou dizendo.

Inocência ou missão

Os pensadores da Escola de Frankfurt foram bastante razoáveis ao criticar o fascismo e o stalinismo, revelando a natureza autoritária do Estado governado por essas duas ideologias.

No entanto, enquanto faziam isso, continuavam acreditando nas promessas socialistas, desenvolvendo seu pensamento sob as categorias marxistas, ignorando que o socialismo que todos eles defendiam, inapelavelmente, sempre acaba desembocando em um governo autoritário.

A impressão que se tem é que eles não viam que o socialismo é um proposta de sociedade que impõe um determinado tipo de ordem que exige planejamento e direcionamento detalhados. O socialismo pressupõe planificação e dirigismo.

Não há, portanto, como implantar uma sociedade socialista sem que seja por meio de uma ditadura. Inclusive, Marx tinha plena consciência disso ao pressupor a ditadura do proletariado.

Não é por acaso que o socialismo sempre transforma-se em ditadura.

Os frankfurtianos não perceberem isso, ao mesmo tempo que criticavam o Estado autoritário, conduz-nos a duas conclusões possíveis: eles eram muito ingênuos, cegados pela fé ideológica, ou seu papel era exatamente tornar o marxismo palatável para o mundo.

O espírito de Frankfurt

Quando o muro de Berlim veio abaixo, quase todos que testemunharam aqueles acontecimentos esperavam que as ideias que o sustentaram ruíssem também. No entanto, aconteceu exatamente o contrário: enquanto a União Soviética sumia do mapa, o marxismo, que era seu espírito, espalhou-se, possuindo almas por todo o mundo.

O comunismo, que parecia decrépito no final dos anos oitenta, aparece completamente vitalizado no século XXI. De intelectuais a políticos, além de quase toda a expressão cultural vigente, praticamente não há ninguém, nem setor algum, que esteja livre da influência marxista, se não nos objetivos políticos, pelo menos na sua forma de pensar.

A verdade é que o comunismo permanece bem vivo, certamente até mais forte do que antes. Após o fim da Cortina de Ferro, ele revigorou-se de tal forma que, hoje, é o pensamento dominante no mundo.

Como ele conseguiu isso?

Quem salvou o comunismo foi a Escola de Frankfurt. Ela, que desde os anos 30 serviu de fonte de debates e reflexões sobre o marxismo e sua relação com a sociedade, depois que, por causa das circunstâncias relativas à ascensão nazista na Alemanha, mudou-se para os Estados Unidos, conseguiu difundir suas ideias, de maneira que elas penetrassem profundamente no imaginário das pessoas e em sua cultura.

As ideias dos pensadores da Escola de Frankfurt penetraram fundo nos corações e mentes porque, por um lado, conseguiram preservar o ideal marxista sem ferir seus fundamentos, por outro, deu novo ânimo ao movimento, libertando-o das amarras que não permitiam que ele se expandisse.

A verdade é que o comunismo, com a implantação do regime soviético na Rússia, tornou-se, cada vez mais, um sistema hermético e doutrinário. Fundamentados nas ideias estabelecidas na Primeira e Segunda Internacionais, o regime estabeleceu-se, fechando-se dentro de si mesmo, tornando o comunismo uma ideia desapegada do resto da humanidade. Comunistas eram aqueles seres estranhos, que viviam em uma terra estranha, com ideias mais estranhas ainda.

Foram os intelectuais judeus-marxistas da Escola de Frankfurt, como Horkheimer, Adorno e Marcuse que deram vigor a um movimento (que sempre existira dentro do comunismo) de revisão dessa maneira cerrada de ver as ideias comunistas e passaram a divulgar seus pensamentos.

Mal vistos pelos marxistas ortodoxos, os intelectuais de Frankfurt, pouco a pouco, conseguiram aproximar o marxismo da vida real das pessoas que viviam no Ocidente, tornando-o algo palatável, em princípio, até o ponto de fazê-lo agradável e desejável.

O sucesso das ideias frankfurtianas se deram por diversos motivos. O primeiro deles foi o fato de oferecerem uma opção anti-dogmática do marxismo. A forma doutrinária de pensar o marxismo foi fortemente criticada pelos intelectuais da Escola de Frankfurt, que promoveram um pensamento mais flexível das ideias marxistas. Isso elevou-o para algo menos materialista, em seu sentido mais estrito, e acrescentou um aspecto espiritual a ele (entendendo-se aqui espírito como algo ligado à intelectualidade e consciência humanas). Assim, o homem, que no marxismo ortodoxo era visto praticamente como mero efeito das condições materiais da sociedade, ganhou dignidade, com uma certa valorização de sua subjetividade, transformando-o em autor da obra revolucionária, não apenas resultado dela. Com toda essa mudança de perspectiva, outros setores da sociedade, além do proletariado, puderam ser agregados ao movimento responsável pela implantação do comunismo, dando poder de penetração das ideias socialistas por todo o Ocidente.

Claro que isso não aconteceu do dia para a noite. Enquanto existia a União Soviética, esse marxismo liberal de Frankfurt se estabelecia de maneira um tanto sorrateira, algumas vezes com o próprio aval de Moscou, outras em formas que iam além do que o próprio núcleo do Politburo podia controlar.

O fato é que, enquanto o comunismo soviético ia se degradando, dia após dia, o outro comunismo, saído das penas dos intelectuais da Escola de Frankfurt ia se expandindo, apoiado pela longa marcha pelas instituições, com influência das ideias promovidas por Antonio Gramsci.

O comunismo então foi se moldando para seduzir novos adeptos, inclusive aqueles ligados a setores antes completamente rechaçados pelo movimento, como religiosos, minorias, marginais, espiritualistas e mesmo grandes capitalistas.

Quando a União Soviética cai de vez, junto as estátuas de Lenin derrubadas, o espírito do novo comunismo se liberta de vez, agora sem as amarras do corpo doutrinário que lhe limitava.

Hoje, quase mais ninguém está livre da influência das ideias marxistas. Graças à Escola de Frankfurt, elas se tornaram tão amplas e maleáveis que quase nenhum setor da sociedade pode dizer que consegue manter-se completamente protegido delas.

Inclusive, a maleabilidade é tal que até permite com que comunistas neguem essa sua condição, usando as ideias de Frankfurt para parecer que são críticos do comunismo, quando, na verdade, estão apenas usando do mesmo expediente da escola: criticar um aspecto exterior da ideologia para fortalecer seu espírito.

O PCO e a defesa do indivíduo

O que faz comunistas, como os membros do PCO – Partido da Causa Operária, defenderem, da mesma maneira como fazem conservadores e direitistas, liberdades individuais, falar contra a obrigatoriedade da vacina, criticar o uso de bandeiras identitárias e o politicamente correto e ainda defender o armamento da população?

Dizer que fazem isso como forma de enganar as pessoas, a fim de cooptá-las para seu movimento, é uma resposta bastante simplista, meramente psicologista, e que não explica seus verdadeiros motivos. Para compreendê-los, é preciso antes entender a concepção deles sobre a composição política do mundo.

Quando eu comecei a estudar, de maneira mais sistemática, a filosofia marxista ortodoxa (vertente da qual o PCO faz parte), a primeira impressão que tive é que o que era dito ali não estava totalmente errado. Em termos filosóficos, esse marxismo fala muito em objetividade, realismo, contra o subjetivismo – tudo de maneira que parece estar de acordo com o melhor que existe do pensamento tradicional.

No entanto, apesar das aparências e até das semelhanças pontuais, os motivos do marxismo ortodoxo são completamente outros. Seu realismo é o de um mundo totalmente materializado, sem qualquer abertura para o transcendental; seu objetivismo é de uma realidade fechada, na qual o homem é apenas um efeito; seu anti-subjetivismo é somente uma confirmação de seu próprio materialismo e anti-espiritualismo.

Isso quer dizer que, às vezes,certas semelhanças de concepções são apenas aparentes. No caso dos conceitos filosóficos, são semelhanças meramente semânticas.

Em relação aos assuntos menos filosóficos, apesar de superficialmente algumas ideias manifestadas pelo PCO serem idênticas aquelas que os conservadores e direitistas defendem, os fundamentos são completamente outros.
O PCO é um partido trotskista. Isso quer dizer que ele faz parte de uma ala ainda mais radical do marxismo do que a maioria da esquerda que atua, hoje em dia. Até por isso, sua visão de mundo é bem mais dogmática e dualista do que o esquerdismo globalista que conduz a política mundial. Para um membro do PCO, todos os governos atuais – e os Estados dirigidos por eles – fazem parte de um fascismo reacionário e representam os interesses do capitalismo burguês inimigo do proletariado. Sendo assim, tudo o que os governos fazem não passam de ações opressivas do Estado contra o trabalhador. Sob esta perspectiva, a vacinação obrigatória, o politicamente correto e o desarmamento da população seriam meras maneiras que o Estado burguês teria de oprimir ainda mais o indivíduo, tornando seu governo cada vez mais forte. O PCO, portanto, não está exatamente preocupado com indivíduo, mas em denunciar as ações do que ele considera ser um Estado fascista.

Os trotskistas do PCO não criticam o Estado da mesma maneira que os conservadores e direitistas. Estes defendem a liberdade individual por princípio, independentemente do espectro político que o governo representa. Os trotskistas, por outro lado, acusam os atos específicos desse Estado, não porque entendem que os direitos individuais são indiscutíveis, mas simplesmente por considerarem o atual Estado um representante de uma classe inimiga. O PCO, na verdade, defende os indivíduos por estes viverem sob governos que eles consideram fascistas. Se o governo fosse trotskista, a conversa seria outra.

A Teologia da Missão Integral é marxista?

Mesmo afastado das questões religiosas, fui convidado a falar sobre a Teologia da Missão Integral (movimento protestante que se apresenta como uma alternativa à cultura evangélica tradicional) e sua relação com os movimentos de esquerda.

A pergunta básica que me fazem é: a TMI é marxista?

A verdade é que os personagens proeminentes do movimento, em geral, camuflam suas influências marxistas. Fazem isso por meio de uma linguagem diversionista, aproveitando-se das expressões e imaginário cristão e da linguagem bíblica.

Quando, porém, observamos os pioneiros da Teologia de Missão Integral, que é um movimento que nasce no auge de Guerra Fria, entre as décadas de 50 e 60, sua linguagem é muito mais explícita. Aqueles pastores e líderes falavam abertamente contra o capitalismo, contra a direita política e a favor do socialismo. Muitos se diziam marxistas mesmo e se expressavam, de maneira muito clara, sobre revolução.

Os integrantes da TMI de hoje em dia, com raras exceções já não falam de forma tão explícita sobre socialismo, nem apresentam-se como marxistas. Sua abordagem é muito mais sutil.

Na verdade, os novos apologetas da Missão Integral, apesar de não se declararem abertamente como marxistas, raciocinam à maneira marxista. Por mais que não se assumam, seus fundamentos são marxistas, sua forma de pensar é marxista, seus conceitos são marxistas. Se não são marxistas por convicção, no mínimo o são por influência.

É aquela velha história: tem cheiro de banana, gosto de banana, cor de banana, então é banana.

A Teologia da Missão Integral até pode não se apresentar como marxista, mas certamente ela é um dos filhotes do marxismo e da cultura marxista que se impregnou na mentalidade do Ocidente.

A Importância do Marxismo

Não há melhor adversário para um inimigo perigoso do que aquele que o ignora.

No entanto, eu tive uma surpresa ao oferecer meu curso sobre os fundamentos da filosofia marxista: muitos daqueles que se dizem inimigos do marxismo condenaram minha iniciativa. Na cabeça deles, se algo é mau deve ser ignorado.

Algumas pessoas simplesmente não conseguem entender alguém dedicar seu tempo estudando algo no que não acredita e que entende ser errado. Como disse o Guto Perreti: o brasileiro não sabe a diferença entre o que é importante e o que é  bom. Se identificam que algo é ruim, concluem que deve ser desprezado.

No entanto, o marxismo pode ser mau, nocivo, perigoso, mas, diante do seu poder de infiltração na cultura e na mentalidade das pessoas, tornou-se algo de extrema importância, passível de estudos aprofundados.

Lembro-me do quanto, em um determinado período da minha vida, quando dava aulas de teologia, dediquei-me ao estudo da demonologia. Com o marxismo, agora, acontece algo semelhante: estudar as ideias de Marx e seus seguidores é, para mim, como tentar entender a atuação de uma horda de demônios e sua influência sobre os homens.

Nisto está a importância do marxismo: sendo uma ideia que penetrou na cabeça das pessoas e moldou a forma delas pensarem, entendê-lo se tornou essencial.

Ainda bem que nem todo mundo é idiota neste país. Há diversas pessoas que sabem a importância de se compreender não apenas aquelas ideias às quais nos afeiçoamos, mas principalmente aquelas que mais influenciam as pessoas, ainda que estejam completamente equivocadas.

É para estas que me dirijo.

Marxismo e Currículo Acadêmico

A pós-graduação em Retórica e Oratória que fiz poderia, tranquilamente, ser chamada de Universidade de Marxismo. Isso porque todas as matérias, todas as perspectivas, todas as teorias ensinadas ali eram fundamentadas ou inspiradas nas teorias marxistas. Não importava o tema: fosse a Análise do Discurso, Teoria da Comunicação, Linguística ou Interpretação de Texto, tudo era visto conforme os ensinamentos dados por Karl Marx e seus asseclas.

Foi então que eu percebi que não era apenas que o ensinamento estava baseado no marxismo, mas que o marxismo tinha delimitado o que deveria ser ensinado. Os marxistas compuseram o currículo do mundo acadêmico atual. O que sobreviveu é o que passou pelo seu crivo.

A teoria da evolução é o exemplo mais notório. Se ela é tratada como matéria indiscutível é porque Karl Marx encampou-a explicitamente. Sendo assim, nenhuma outra teoria que a confronte sequer pode ser discutida no ambiente acadêmico.

Essa realidade envolve todas as outras matérias. Faça o teste: observe uma teoria que o mundo acadêmico tenha por indiscutível e comprove se ela não é uma confirmação da visão marxista. É infalível.

Anti-religiosidade marxista

Não há comunhão entre cristianismo (e qualquer outra religião) e marxismo. E não sou em quem diz, mas os próprios pensadores marxistas, como o filósofo russo Afanassiev.

Segundo ele, a religião é uma espécie de fuga que os homens, com a sensação de impotência imposta pela exploração capitalista, promovem, na busca por salvação.

Por esse motivo, a religião seria uma deformação da realidade, afastando os indivíduos dos problemas reais. Não por acaso Marx dizia que a religião é o ópio do povo.

Na verdade, a religiosidade esmoreceria nos crentes o sentido de classe. Por isso, os marxistas deveriam dedicar-se à luta contra os resquícios religiosos.

Portanto, ainda segundo o filósofo, comunismo e religião (seja ela qual for) não podem conviver.

Se alguém, portanto, diz-se cristão e socialista precisa acertar as contas com os dois lados: Jesus e os próprios marxistas.