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Vocação para a Política

O cidadão comum vê os conchavos políticos como imorais. Tanto que os condena em sua vida privada, onde mentir é errado, enganar é feio, prometer e não cumprir é vergonhoso ─ tudo que é natural na política. Aí, de repente, impulsionado pelas novas tecnologias, esse mesmo cidadão passa a acreditar que pode atuar diretamente nos jogos de poder ─ os mesmos jogos onde o que mais se pratica são aquelas atitudes que ele considera antiéticas.

O que o cidadão, algumas vezes, esquece é que povo e política não costumam se misturar. A participação popular, em algum momento, pode ter algum efeito, mas não costuma passar de uma ilusão temporária. No fim, prevalece a vontade da mesma elite de sempre. Em política, até podem acontecer convulsões pontuais, mas as coisas tendem a voltar ao seu padrão histórico, que não conta com a participação do homem comum.

Política prática não é atividade para o cidadão comum porque ele não está disposto a abrir mão de suas convicções morais para se lançar nela. O mundo político é um clube fechado, que exige, como ingresso, requisitos que o cidadão comum não quer ter. E se não está disposto a tê-los, não está apto a jogar o jogo da político e, por isso, seria um contrassenso querer vencê-lo.

O fato é que ser politico é uma vocação e para ingressar nessa carreira é preciso não ter suscetibilidades afloradas para os negócios obscuros que acontecem nos corredores dos palácios. Se a pessoa fica escandalizada com o que acontece no meio político, melhor mesmo é esquecê-lo e ir para casa estudar. Até porque contribui mais para o país um cidadão consciente e conhecedor da realidade do que um político inocente incapaz de se movimentar entre os gabinetes.

Ainda que política seja importante, nem todo mundo nasceu para ela, da mesma maneira que nem todo mundo nasceu para ser artista, jogador de futebol, engenheiro, médico ou jornalista. E insistir em uma carreira para a qual não se tem inclinação é desgastante e frustrante.

Por isso, para quem não tem vocação para a politica, melhor mesmo é manter uma distância segura dela, acompanhando tudo com bastante cuidado e parcimônia.

Enfadonhas Certezas Políticas

Outro dia fui convidado para participar de um seminário sobre política. Depois das palestras, sempre há aquele momento que oradores e plateia se juntam para conversar mais pessoalmente. Não me furtei a isso. No entanto, confesso, não consegui ficar mais do que vinte minutos no local.

No dia seguinte, encontrei-me com meus alunos de filosofia e foi como um bálsamo. Passei o dia inteiro com eles e ficaria mais. A diferença é que enquanto aquelas pessoas do dia anterior tinham certeza de tudo, teoria sobre tudo, respostas exatas sobre as questões mais complicadas do mundo e as soluções para os problemas mais complexos da sociedade, meus alunos tinham principalmente dúvidas.

Pessoas muito certas do que falam costumam ser chatas porque não há espaço, no diálogo com elas, para o aprendizado. Há apenas a exposição do que se pensa que se sabe. Geralmente, quem participa de movimentos políticos já escolheu um lado, possui uma ideologia pronta, tem uma visão de mundo bem estabelecida. Uma conversa de cinco minutos com qualquer pessoa desse tipo, por isso, torna-se enfadonha, pois não passa de um desfile de teorias e convicções.

Toda vez que troco palavras com pessoas ligadas à política me frustro. Não porque não gosto de falar sobre política – pelo contrário –, mas costumo fazer isso tentando levantar mais suspeitas do que certezas. Consciente da dificuldade que existe na colheita dos dados que devem formar meu conhecimento, prefiro tomar as informações como temporárias e suspendo os julgamentos o máximo que eu posso. No entanto, isso é visto nos meios políticos como falta de engajamento, como isenção. Neles, se a pessoa não tiver muito claro o que está ocorrendo no mundo, quem são os inimigos a se combater e os objetivos a se buscar ela é vista como alguém que mais atrapalha do que ajuda.

Na política, não há muito espaço para questionamentos. Simplesmente, você precisa entrar nela já certo de todos os movimentos que ocorrem na sociedade, com todas teorias sobre as forças que existem bem estabelecidas em sua mente. Qualquer vacilo quanto a tudo isso é sinal de fraqueza.

A militância política é o exato oposto do que se espera de uma personalidade filosófica. Esta, apesar de buscar a verdade e perseguir a certeza, tem como princípio a dúvida e como primeira lição o mapeamento da própria ignorância. Uma mente filosófica compreende a complexidade do mundo e sabe que os fatos são sobrepostos. Por isso, ela entende que as primeiras impressões que tem sobre o que acontece geralmente não refletem a verdadeira natureza das coisas nem a essência dos fatos.

Se a filosofia propõe mais perguntas do que oferece respostas não é porque se delicia na dúvida, mas por querer encontrar uma verdade que seja inabalável e sabe que, para isso, tem de rastrear os dados com muito cuidado e parcimônia.

Não é por acaso que minhas conversas com os alunos de filosofia são deliciosas: elas não possuem aquela certeza apressada de quem acha que pode entender o mundo com base em algumas informações confusas. O verdadeiro estudioso de filosofia é humilde, no sentido mais exato desse termo, sabendo sua posição no mundo e seu estado atual de conhecimento, estando, assim, mais abertos ao aprendizado mútuo. Por isso, apesar de não haver certeza sobre muitas coisas, os diálogos com eles são muito mais frutíferos.

Espectadores de um Teatro Macabro

Os homens, em algum momento da história, perceberam que seu estado de natureza representava uma limitação para o desenvolvimento comunitário e, para superar essa barbárie, criaram a civilização.

A civilização, portanto, nada mais é do que um conjunto de técnicas e artifícios produzidos para abafar nosso primitivismo e conter nossos instintos.

Apesar de sobreviver em nós um resquício de intuição de nossa natureza bárbara e do caos que é o nosso mundo, sufocamos-na, refugiando-nos nos quadros fantasmagóricos que pintamos. Esquecemos do caráter artificial da sociedade que criamos e vivemos como se tudo nela fosse natural e espontâneo.

Os ritos, as liturgias, as leis, as convenções ─ tudo que serve para substituir o caos da natureza ─ acabam assumindo o papel da realidade. Passamos, então, a viver em um ambiente ilusório, mas convencidos de que se trata da realidade mesma, dedicando a ele nossas esperanças, esforços e investimentos; esperando dele todas as respostas.

Às vezes, temos algum lampejo de lucidez e entendemos que há muito mais para além desses jogos sociais. Porém, é tarde. Depois de tanto tempo vivendo sob a ilusão, a maior parte das pessoas se tornou incapaz de perceber que tudo não passa de um simulacro.

Assim, denunciar a mentira constitutiva de nossa sociedade torna-se inútil. Há muito tempo, aceita-se a pose, a farsa, o fingimento e a afetação como a representação fiel da realidade e, agora, quem pretende se colocar do lado de fora dessa ficção obviamente será tido por maluco.

Diante disso, resta para os minimamente despertos participar desse teatro macabro como meros espectadores, conscientes da natureza fantástica da encenação, sendo permitido comentar sobre as cenas, torcer pelos personagens e até opinar sobre o roteiro, mas sem qualquer poder para influenciar o espetáculo.

Retórica do Oprimido Amigo do Poder

As falas esquerdistas são sempre carregadas de vitimismo. Com iphone na mão ou andando de jatinho, expressam a dor dos perseguidos, a revolta dos desprivilegiados.

Ao mesmo tempo que posam de oprimidos, os esquerdistas tornaram-se defensores do sistema. Louvam líderes globais, promovem agendas ditadas pelos poderosos e, pasmem, acreditam piamente nas mega corporações.

Se os esquerdistas estão do lado dos grandes poderes globais não é porque deixaram de ser socialistas, mas porque esses poderes deixaram de ser liberais, tornando-se cada vez mais socialistas.

O socialismo é a cultura dominante dos nossos tempos e a univocidade dos discursos, repetindo as categorias do marxismo, é a prova disso.

Hoje, não pensar como socialista é colocar-se na contramão do sistema; é por-se do lado contrário aquilo que está se tornando regra e senso comum.

Os poderosos deste mundo impõem o discurso belo, certo e moral, os esquerdistas, estupidificados, replicam-no docilmente e os outros, que se recusam a tomar parte nesse processo, parecem malucos no meio disso tudo.

A relação da esquerda com o poder é íntima e lasciva. Ela se diz vítima, mas é apenas uma mucama satisfeita das forças financeiras e políticas do globo; rameira bem paga das potestades macabras que ditam os caminhos da humanidade.

Eleições e Soberania

Um dos perigos de acompanhar política diuturnamente é perder-se na imensidão de notícias que se sobrepõem, sendo boa parte delas referentes a trivialidades irrelevantes.

A urgência política é insaciável e clama por olhares superficiais, que teimam em estacionar nas questões mais comezinhas dos ardis palacianos.

As pequenezas políticas são uma perfeita forma de entretenimento, pois, enquanto prende o público nos capítulos da novela pública, permite que os movimentos mais importantes, muitas vezes, passem desapercebidos.

No presente momento, a multidão inconformada com a fraude evidente acompanha atentamente o desenrolar do romance tecnológico envolvendo as urnas, com seus códigos-fonte e algoritmos. A cada dia, um capítulo; a cada momento, uma novidade.

Enquanto isso, o eleito pelas máquinas suspeitas já fala como chefe maior do Estado e não esconde que está pronto para atuar, na verdade, como representante das forças internacionais que sempre tiveram um olhar cobicento para o que temos de naturalmente precioso nestas terras.

Sem nenhum pudor, nem respeito ao sentimento nacional, ele expõe abertamente seu plano de atrair as forças globais para a Amazônia, com a desculpa de que somos incapazes de cuidar de nosso próprio quintal.

Há alguns dias escrevi que o nosso problema não era eleitoral, mas de soberania, e, a cada dia, vai ficando mais claro o que eu quis dizer.

Nosso problema eleitoral é apenas a parte técnica de um desejo mundial que nosso país esteja, cada vez mais, alinhado aos projetos globalistas. Poderíamos até dizer: não alinhados, mas submetidos.

Fascistas e Nazistas

Uma opinião política é perceptivelmente dada sem qualquer noção da realidade quando usa das expressões ‘fascista’ e ‘nazista’ para acusar os grupos políticos de direita. Isso porque essas expressões não descrevem a direita, mas apenas serve para identificá-la, sem qualquer relação verdadeira, com algo odioso.

Talvez aja um outro motivo um pouco mais trivial nessa acusação: esconder aquilo que os próprios acusadores são e sua relação com aquelas ideologias. A direita, que é acusada de fascista, nada tem de tal. Por outro lado, a esquerda, possui diversas propostas e concepções que se identificam imediatamente com o fascismo e com o nazismo.

O lema essencial do fascismo era “Tudo pelo Estado; nada fora do Estado; nada contra o Estado”. Para ele, o Estado deveria agir como um grande Leviatã, comandando tudo, dirigindo tudo, cuidando de tudo, tornando os cidadãos como meros seus vassalos. Quem vai negar que é a esquerda que suscita esse tipo de veneração do Estado? Afinal, é exatamente ela que trabalha para o seu fortalecimento e discorda daqueles que pretendem diminuir sua atuação e influência.

Outro ponto dos fascismo, e que é comum ao nazismo, é o desprezo à liberdade individual, muito caracterizado pelo desarmamento universal. Inclusive, uma das primeiras providências do governo nazista foi desarmar toda a população civil. Todos sabemos que são os esquerdistas que militam pelo desarmamento civil. Porém, não pensem que eles fazem isso por uma preocupação com a violência social, fato que eles sabem que não tem relação com o armamento das pessoas comuns e não criminosas. Os esquerdistas, na verdade, não suportam ver o indivíduo cuidando de sua própria vida, de sua família e de sua propriedade, porque, pela eles, quem tem que ter o monopólio da violência é o Estado.

A última característica que eu gostaria de pontuar é a relação, principalmente dos nazistas, com os judeus. Os nazistas odiavam judeus. Por outro lado, fizeram acordos e alianças com os grupos muçulmanos. Entre a esquerda e direita, hoje, todos sabem, quem tem boa relação com os judeus são exatamente estes, enquanto aqueles até militam abertamente contra Israel. Atualmente, quem assumiu a aliança com os palestinos foram os esquerdistas, que não cansam de condenar a existência do país israelense, num mal disfarçado antissemitismo.

Apontando tudo isso, não estou afirmando que fascismo e nazismo são de esquerda, menos ainda de direita. No entanto, está mais do que demonstrado que, observadas objetivamente as propostas e as ideias, não há nenhuma dúvida que as da esquerda são muito mais assemelhadas àquelas promovidas pelas condenáveis ideologias do século passado.

O Pior dos Elitismos

Na história de todas as civilizações, em todas as épocas, sempre manifestou-se um elitismo, pelo qual um grupo de pessoas especiais e com responsabilidades superiores destacaram-se como os diretores do povo. Não há nada de errado com isso. Pelo contrário, é natural e faz parte da própria estrutura da sociedade determinados poderes serem exercidos por uma minoria.

Há, porém, um outro tipo de elitismo, este sim pernicioso, que é velado e, a despeito de apresentar-se como o defensor daqueles que considera inferiores, trata-os, na verdade, quase como incapazes, senão como imbecis. Como, por exemplo, quando um político afirma que em um eventual mandato seu o povo vai poder voltar a comer carne e tomar sua cervejinha no final de semana. O que ele está querendo dizer com isso? Os mais apressados dirão que ele está preocupado com os pobres, mas não é preciso ser muito perspicaz para perceber que, nesta afirmação, há uma inferiorização das pessoas, ao tratá-las como meros seres que sobrevivem satisfazendo suas necessidades mais básicas, seres que não podem e nem querem nada mais do que aquilo que permite sua baixa posição social.

O que me impressiona é ver como esse tipo de discurso foi normalizado, impedindo de se perceber nele um elitismo da pior espécie, a saber, um elitismo que acredita que somente alguns poucos privilegiados têm direito de viver uma vida superior, enquanto todo o restante da população seria incapaz dela e nem mesmo a deseja, contentando-se apenas com pão e circo. Ter como ponto alto de uma campanha eleitoral a promessa de que a satisfação de necessidades tão básicas será motivo de orgulho é reduzir o povo a uma condição apenas um pouco superior a de animais.

Quando eu escrevi sobre o POPULISMO ELITISTA, quis deixar claro que o pobre não é pobre por opção, nem sua vida é uma idealização de qualquer coisa. Apenas os ricos a glamourizam, porque não são obrigados a viver nela. Para o pobre, a pobreza é prosaica. No entanto, se ele puder escapar dela, jamais negará tal oportunidade. Para o elitista da pior espécie, porém, a pobreza é um estado definido e quem nela vive não deveria sequer ter o direito de fugir dela, mas, no máximo, transformá-la em algo um pouco mais agradável, talvez regada a churrasco e bebida.

Obviamente, mesmo um bom governante nem sempre consegue colocar em prática atos que ajudem o pobre a superar sua condição. Os elementos envolvidos são muito complexos para qualquer pessoa achar que esse é um problema solucionável facilmente. Porém, todo governante tem a obrigação de não atrapalhar essa busca. E não há pior maneira de ser um entrave para que o pobre deixe de ser pobre do que tratar seu estado de pobreza como uma condição inescapável e, pior, como a forma de vida realmente desejada por ele.

O pior elitismo é aquele que promove uma forma de vida inferior como aquela desejada pelos inferiores, da qual eles nem sequer vislumbrariam superar. O pior elitista de todos é aquele que decreta que o que as pessoas desejam é a carne e a cerveja do final de semana, enquanto ele mesmo não se contenta com nada menos do que as posições sociais mais altas, inclusive o posto mais alto de poder de uma nação.

Igreja é Refúgio

Para seguidores de seitas político-materialistas tudo é política. Não é por acaso que eles transformam mesmo a mensagem mais espiritual em guerra social. Seu principal objetivo é colaborar com a transformação do mundo, o que se torna como seu propósito.

Quando eles infiltram-se nas comunidades religiosas, constituem-se em panfletos vivos, ávidos por convencer os outros fiéis em militantes de sua causa. Em seus discursos, salvação se transforma em libertação política e sacrifício em capacidade de doar-se à luta social. Sua pregação faz o
fiel olhar antes para a terra, e o céu se distancia cada vez mais.

Quem não comunga das mesmas convicções políticas dessa gente acaba enredado num dilema. Como contrapor seus discursos e defender-se desse ataque verbal constante que sofrem dentro de um ambiente essencialmente espiritual?

Por muito tempo, acreditei que um pecado que os líderes cristãos cometiam era evitar tratar desses temas mundanos. Eu pensava que exatamente por imiscuir-se de transformar a Igreja numa fortaleza de batalha, estávamos perdendo a guerra. Ao ver a militância ganhando tanto espaço no seio de comunidade religiosa, critiquei os pregadores que pouco falavam de política no púlpito.

Hoje, já começo a questionar essa convicção. As palavras de Edmund Burke que, inconformado com o uso do púlpito para a propagação de ideias revolucionárias, achava que a Igreja deveria ser preservada dessa guerra, começam a ressoar mais forte na minha cabeça. Ele dizia que “nenhum som deveria ser ouvido na igreja, senão a adorável voz da caridade cristã”. Ele também afirmava que “a Igreja é um lugar que deveria dar um dia de trégua às dissensões e animosidades da humanidade”. Isso porque, para Burke, a Igreja, cumprindo seu papel histórico, deveria ser preservada como lugar de refúgio em meio à guerra, onde as pessoas pudessem se sentir protegidas, sabendo que, pelo menos ali, não seriam agredidas.

É certo que, quando a mensagem mais constante e importante pregada dentro de uma comunidade religiosa é voltada para as questões políticas, há um rebaixamento da missão eclesiástica. Pode-se dizer que o discurso político mancha o Evangelho. De alguma forma a Igreja é corrompida.

Obviamente, dentro das circunstâncias atuais, simplesmente negar-se a abordar questões políticas faz dos próprios fiéis vítimas indefesas daqueles que incessantemente propagam suas ideologias travestidas de caridade. Por outro lado, decidir confrontá-los direta e abertamente, traz o risco de transformar a Igreja num campo de guerras políticas intermináveis, onde a única vitória certa é do ódio característico que envolve essas disputas e a sede de sangue que lhes acompanha.

Cada vez mais me convenço que as palavras bíblicas, que dizem que nossas armas são espirituais, devem ser interpretadas literalmente. Estou mais certo que afastar o mal de ideologia política que tenta tomar a Igreja como mais uma de suas comunidades de base, depende de uma elevação da pregação, impulsionando seus ouvintes a buscarem aquilo que é superior e que transcende as agitações mundanas.

Quando o papa Bonifácio VIII reiterou o que a Bíblia ensina, que o espiritual discerne o carnal, mais do que uma afirmação de poder, havia ali o ensinamento de que, em uma eventual disputa entre eles, o espiritual sempre vence, porque suas armas são superiores. Sua declaração não queria dizer que ambos estão em uma disputa de forças, mas sim que o espiritual sempre se sobrepõe, simplesmente por estar acima.

A Igreja não precisa imiscuir-se numa guerra política, porque ela é, na verdade, a solução para a guerra política. Isso quer dizer que se seus representantes quiserem anular aqueles que tentam usá-la para seus fins ideológicos basta elevar a alma de seus fiéis para além da mundanidade. Homens verdadeiramente espirituais estão devidamente vacinados contra a doença da ideologia materialista.

Os marxistas acreditam que tudo é política e esforçam-se por rebaixar tudo a esse nível. O que eles mais odeiam são aqueles que desprezam esse politiquismo integral. Inclusive, costumam chamá-los de alienados. Portanto, sentem-se muito bem quando a Igreja rende-se à guerra política e coloca esse assunto como pauta principal de sua pregação. Quando, porém, os sacerdotes e profetas falam daquilo que lhes é próprio, e saber, e salvação, o pecado, a redenção e a espiritualidade, os usurpadores tremem.

Isso não significa que a política jamais deva entrar na pauta das pregações. Pelo contrário, é importante tocar nesse assunto, ocasionalmente, principalmente com o intuito de alertar para os perigos que a ideologia materialista oferece. Todavia, essa pregação deve vir sempre de cima para baixo, com o espiritual julgando o carnal, permitindo que a Igreja evite ser palanque para a hipocrisia característica do discurso político e seja praticamente o único lugar que ainda sirva de refúgio para almas se aliviarem da loucura deste século.

A Importância da Política

Em ano eleitoral, é bom preparar-se para testemunhar a diminuição sensível da diversificação dos temas tratados nos fóruns de debates espalhados pelos diversos meios de interação social. Chega um momento em que quase nenhum assunto parece mais ter relevância senão aquele que se refere exclusivamente à corrida pelos votos.

Nem é prudente tentar, nessas épocas, arriscar-se por materiais que não cuidem especificamente dos embates políticos do momento. Quem se dispõe a fazer isso tem muitas chances de ser rechaçado como um “alienado” ou alguém insensível ao problema primordial que a sociedade experimenta.

No entanto, apesar de reconhecer a importância da política, estou certo de que, dentre as coisas mais importantes, ela, sem dúvida, é a menos importante.

A política é o meio pelo qual os homens perseguem seus objetivos sociais. Seu caráter, portanto, é intermediário. O poder, que é o objetivo imediato da política, nada mais é do que o instrumento para agir na sociedade, a fim de melhorá-la.

Se a política é hipostasiada, porém, deixa de haver uma finalidade no seu exercício. Aqueles objetivos que se encontram além dela e que fazem parte de sua razão de ser deixam de existir, tornando-se, eles mesmos, meios de disputas. O que aguardava o efeito da ação política passa a fazer parte agora da própria política.

Os elementos absorvidos no jogo político, então, são destituídos de sua própria essência. Eles já não se mantêm instalados naquele nível do conhecimento que procura entender o que as coisas são. Sua natureza perverte-se, pois passam a fazer parte de um ambiente retórico, onde o que importa é a persuasão e as coisas, no máximo, podem ser tratadas como verossímeis.

A hiperpolitização rebaixa tudo ao campo das disputas verbais, transformando cada detalhezinho da existência em um potencial material de conflito. Todo fenômeno insinua-se como arma e seja qual for a forma como a realidade se manifesta, parece que sempre reclama posicionamento em um dos lados da trincheira.

Quando tudo se transforma em política, a própria política não tem mais razão de ser. A partir do momento que não há mais objetivos fora dela, todas as coisas passam a fazer parte do jogo de poder interminável, insolúvel e inescapável.

Tecnologia e Poder

Sempre gostei de novidades tecnológicas. Desde jovem, estive na vanguarda dos usuários dos aparelhos mais modernos. Com o tempo, porém, meu entusiasmo pela tecnologia foi sendo ponderado pela consciência do papel dúbio que ela exerce: de facilitadora das minhas tarefas cotidianas e de arma de opressão nas mãos dos poderosos.

A maneira como as invenções tecnológicas tornam a nossa vida mais fácil é evidente. Aliás, está na própria definição de tecnologia ter como objetivo fazer com que ações sejam facilitadas. Todo instrumento tecnológico existe para diminuir o esforço e a complexidade de uma ou várias tarefas humanas.

Há porém um outro lado da tecnologia que, dificilmente, as pessoas se dão conta: a maneira quase instantânea como qualquer uma de suas invenções torna-se instrumento de opressão na mão dos governos. Seja qual for o governo (de esquerda, de direita, fascista, liberal), ele jamais desprezará um instrumento tecnológico se este lhe permitir aumentar sua força e eficácia.

Todo governo (no sentido amplo, que envolve todo o aparato estatal e não apenas o poder executivo) é exercido por meio de normas, as quais, para serem cumpridas, exigem a coerção e a ameaça de punição por parte do Estado. A existência do Estado praticamente resume-se a isto: baixar determinações e zelar para que elas sejam cumpridas.

Obviamente, todo governo se depara com toda sorte de resistência às suas determinações. Todos os dias, há uma multidão que as ignora ou deliberadamente tenta descumpri-las. A resistência ao poder governamental é o que há de mais comum numa sociedade – praticamente a define.

Toda vez que um cidadão obtém sucesso em seu descumprimento das determinações governamentais, mais exposta fica a fraqueza do Estado – o que é inadmissível para, pois o Estado subsiste da autoridade e do respeito que se deve ter em relação a ele.

Para mostrar-se mais forte, então, o governo precisa que seus atos sejam cada vez mais eficazes. Sua capacidade de fazer com que os cidadãos cumpram – ainda que não queiram – as determinações legais estabelece muito do poder real, mas também da sensação de poder que o governo transmite.

A necessidade de eficácia exige instrumentos eficazes. Por isso, um governo não pode abrir mão de nenhum deles, quando lhe estão disponíveis, pois isso significaria abrir mão de algo que lhe faz mais eficaz, portanto, mais forte. Esse é o motivo de não haver ponderação no uso de qualquer recurso que permita o governo agir em favor de seus próprios interesses. Se algo está disponível para ser usado por ele, será usado por ele.

Negar o uso de um recurso que lhe aumente a eficácia é negar sua própria natureza coercitiva e punitiva. Por isso, toda tecnologia, torna-se, no momento mesmo que se torna aplicável, uma virtual arma nas mãos do governo. Ele apenas não a utilizará se seu uso for, por algum motivo, inconveniente.

As pessoas comuns, e mesmo as empresas, têm diversas restrições para usar tecnologias de ponta (custos, necessidade, aplicabilidade, possibilidade, permissão). Um governo, porém, não as tem, senão a inconveniência. No entanto, mesmo esta praticamente só se manifesta em governos democráticos, que têm de obedecer leis e dependem de votos. Governos ditatoriais, por seu lado, que não estão sujeitos à aprovação, nem estão submetidos a uma estrita ordem jurídica, nem a inconveniência possuem – ou as têm em casos muito específicos.

Sendo assim, o que pode impedir um governo ditatorial (ou com pendores despóticos) de fazer uso de um instrumento tecnológico, estando este disponível? O que o impediria de lançar mão de um aparelho qualquer se este lhe permite ser mais eficiente em sua missão coercitiva e punitiva? Quando testemunhamos alguns destes usando, sem nenhum pudor, a tecnologia, de forma a tornar a vida das pessoas mais restritiva, menos livre e mais submetida às determinações governamentais, não há nenhum motivo para escandalizar-se com isso. Afinal, o governo está apenas exercendo a sua natureza, da melhor maneira possível.

Tecnologia e poder estão intrinsecamente conectados. Toda tecnologia insinua-se para o governo, como que pedindo para ser usada por ele, o qual não titubeará em fazer isso. Por isso, apesar de gostar de tecnologia, não me empolgo com ela. Pelo contrário, toda vez que me deparo com uma invenção, logo me pergunto como o governo vai usá-la para suprimir, ainda mais, minha liberdade. E, cedo ou tarde, ele acaba fazendo exatamente isso.