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A Sociedade Holística

O que atrai a simpatia de muitos conservadores brasileiros para o discurso duginista é o seu constante apelo à Tradição. O professor Dugin se apresenta como um verdadeiro apóstolo da filosofia perene e diz querer salvar o mundo da modernidade que o está destruindo.

Segundo o professor Dugin, esses valores modernos têm como princípio o mais puro individualismo, que é a causa de toda competição, egoísmo e materialismo que os caracterizam.

Isso, segundo ele, gera uma sociedade fragmentária, na qual não há qualquer senso de cooperação, nem identificação coletiva. Uma sociedade sem fraternidade e sem unidade.

As mais afetadas por essa influência ocidental sobre todo o mundo seriam as identidades nacionais que, corrompidas pela mentalidade individualista e competitiva que o Ocidente disseminou, enfraqueceram-se.

Por isso, Dugin entende ser importante resgatar um tipo de sociedade que ele chama de holística, a qual se caracteriza por ser, à maneira de comunidades antigas, mais orgânica e hierárquica.

Na visão do professor Dugin, esse tipo de sociedade holística é naturalmente mais fraterna, mais ordeira e mais voltada para a preservação daqueles valores que o mundo moderno destruiu.

Portanto, a proposta eurasiana acaba sendo coletivista. O mundo que ela quer erigir não preza, definitivamente, pela autonomia do indivíduo. Pelo contrário, sua preocupação concentra-se na unidade social e na identidade coletiva, bem à maneira fascista.

Por isso, o eurasianismo vai propor abertamente o confronto direto contra o Ocidente e contra aqueles valores que Dugin vai dizer que, por meio do projeto globalista, têm corrompido o mundo inteiro. Sua luta é, de fato, contra a liberdade que o mundo ocidental propugnou desde o advento de suas democracias liberais.

O truque eurasiano, porém, é identificar toda a libertinagem que há no mundo com a liberdade que o Ocidente promove. Parece que toda depravação que existe é oriunda do Ocidente e que o Oriente é um oásis de puritanismo. O que ele esquece é que o Ocidente sempre foi sustentado por princípios claros de comportamento, baseados em seu alicerce cristão, enquanto toda a liberalização sempre foi patrocinada exatamente por aqueles mesmos que estão do outro lado, promovendo ideologias coletivistas e revolucionárias.

Inclusive, o professor Olavo de Carvalho adverte-nos que a corrupção ocorreu principalmente do Oriente para o Ocidente, através da infiltração que os governos comunistas fizeram, direta e indiretamente, nas instituições ocidentais.

Além do mais, o professor Olavo vai lembrar-nos que os defensores dessas sociedades coletivistas não possuem qualquer moral para julgar o Ocidente, afinal foram exatamente essas sociedades, por meio de seus governos, que cometeram as maiores atrocidades da história. Especialmente a Rússia, com o seu projeto comunista soviético, foi a responsável por milhões de mortes no século XX.

Sempre é bom destacar que o coletivismo possui uma retórica encantadora. Desde o princípio, ele declara que busca liberdade, igualdade e fraternidade. Na prática, porém, mostrou-se intolerante e violento, sufocando qualquer tipo de manifestação livre do indivíduo, além de justificar toda forma de totalitarismos que, com a desculpa de agir pelo bem comum, fazem dos cidadãos seus escravos.

Na verdade, apenas o individualismo (no sentido filosófico desse termo) é capaz de gerar um ambiente solidário. Isso porque apenas ele permite a expressão da fraternidade espontânea. Afinal, é o individualismo, como a forma de vida que protege o cidadão da tirania governamental e coletiva, que respeita a integridade da pessoa humana.

Por isso, quem imagina que o sonho eurasiano representa algum tipo de libertação dos povos ou de promoção da liberdade do indivíduo engana-se completamente. Ele não passa de mais uma ideologia totalitária, com a mesma retórica de fraternidade e igualdade que todos os movimentos revolucionários usaram desde pelo menos o século XVIII.

Vítima do Projeto Globalista

Na ideologia eurasiana, os Estados Unidos aparecem como os pivôs de um projeto de dominação global, que pretende implantar, no mundo inteiro, seu estilo de vida, seu modelo econômico e sua democracia liberal.

Porém, o eurasianismo entende que esse modelo americano nada mais é do que a expressão do indvidualismo, a encarnação da mentalidade materialista, a manifestação do racionalismo iluminista e a dinâmica da sociedade aberta popperiana.

O eurasianismo conclui, então, que essa exportação forçada do modelo americano representa a corrupção do mundo, com o consequente enfraquecimento das manifestações tradicionais dos povos e fragilização das soberanias nacionais.

O professor Olavo de Carvalho, porém, em sua contestação, lembra, antes de tudo, que o projeto de dominação global, arquitetado por ocidentais, não é o único existente, mas concorre com outros dois, a saber, o Russo-Chinês e o Islâmico.

O projeto Islâmico nada mais é do que uma consequência da própria teologia muçulmana, interpretada politicamente, que convoca seus fiéis a expandir a fé islâmica por todo o mundo, nem que seja à força; o projeto russo-chinês, do qual o eurasianismo é sua expressão mais atualizada, nada mais é do que a continuidade da velha utopia comunista, com algumas adaptações, mas conduzido pelos mesmos personagens – afinal, toda a elite russa é composta por ex-membros da nomenklatura soviética, que saíram da URSS milionários e mais poderosos do que nunca.

Quanto ao projeto de dominação global ocidental, o professor Olavo de Carvalho não nega sua existência, inclusive atribuindo a ele o nome de Consórcio, mas contesta a interpretação do professor Dugin de que esse é um projeto americano. Segundo o professor Olavo, os Estado Unidos, especialmente seu povo, são uma vítima do Consórcio, que os usa – de sua prosperidade e poderio militar – para a consecução de seus próprios objetivos.

Isso porque o americano médio é nacionalista e cristão. Sua cultura é baseada na valorização do indivíduo e em sua proteção contra os poderes deste mundo. A Constituição Americana é totalmente fundamentada nesses princípios, inclusive reconhecendo os direitos dos cidadãos diante de seu próprio governo.

Sendo assim, esse nacionalismo americano acaba sendo um entrave para as pretensões do Consórcio, que são alicerçadas numa ideia coletivista. Os globalistas insistem, por meio dos movimentos que patrocina, que, antes de tudo, importa a coletividade e os interesses do todo. O ambientalismo é o exemplo notório desse tipo de mentalidade, que sufoca o indivíduo em favor de um suposto direito coletivo.

O povo americano configura-se como um obstáculo que os globalistas precisam superar e fazem isso, antes de tudo, tentando corromper sua cultura. Portanto, diferente do que afirma o professor Dugin, não são os Estados Unidos que corrompem o mundo, mas os globalistas, muitas vezes em conluio com outros grupos – inclusive os russos, com a notória infiltração cultural marxista e institucional comunista – que fazem de tudo para corromper os Estados Unidos. O fato é que o projeto globalista esforça-se por sufocar o nacionalismo americano, enquanto usurpa suas riquezas e usa de suas instituições.

Na verdade, todos esses três projetos de dominação: o russo-chinês, o islâmico e o globalista, possuem um inimigo comum: o cristianismo, conforme expressão de fé de pessoas individuais e independentes das forças governamentais. Todos esses projetos expressam um ódio extremo pelo individualismo cristão. Para eles, a fé não pode se ruma expressão do homem em sua individualidade, mas, quando não for simplesmente extinguida, deve servir aos interesses do Estado.

Por isso, não dá para se empolgar com qualquer proposta vinda dos ideólogos russos. Nós que valorizamos a fé individual e a liberdade de consciência não podemos nos iludir com qualquer proposta oriunda de quem acredita que essa autonomia é um problema.

Breve Introdução ao Eurasianismo

Há uma guerra acontecendo, com o potencial de acarretar sérias consequências a todo mundo. Diante disso, acredito ser importante fazer uma análise mais aprofundada sobre as razões ideológicas que existem por trás das ações do governo de Vladimir Putin, e que estão além dos motivos geopolíticos e econômicos declarados.

Nem todo mundo sabe, mas Putin possui como que um conselheiro permanente em assuntos estratégicos. Alexandr Dugin é a mente por detrás de muitas das decisões do presidente russo e o principal responsável por fornecer para o governo uma estrutura ideológica que lhe dê sustentação.

Há dez anos, o professor Dugin – que possui alguns admiradores aqui no Brasil – foi convidado para um debate, por escrito, com o professor Olavo de Carvalho. O debate, então, transformou-se em um livro, chamado “Os Estados Unidos e a Nova Ordem Mundial”. Nele, a ideologia duginiana foi exposta e devidamente contraditada pelo professor Olavo. Nas próximas linhas, farei uma síntese daquilo que Dugin expôs, para que possamos começar a entender o seu pensamento.

Segundo o professor Dugin, depois do fim da guerra fria, nasceu uma Nova Ordem Mundial, baseada na cooperação entre os EUA e a URSS. No entanto, com a dissolução desta, os Estados Unidos passaram a buscar o controle hegemônico da política e da economia mundiais. Para isso, eles apostariam em três vias concomitantes: a do Império Americano (da preferência dos neocons), a da unipolaridade multilateral (da preferência dos democratas) e o do simples e direto governo mundial (delineada nas mesas do CFR).

Tudo isso porque, conforme pensa Dugin, os EUA enxergam a si mesmos como o pico da civilização e o fim da história. Com isso, entendem-se obrigados a impor uma ordem global unilateral, tendo seu estilo de vida como o modelo a ser seguido em todo o mundo. Nessa tentativa de imposição, os EUA estariam promovendo um período de transição, que seria a passagem do liberalismo para um tipo de pós-humanismo, com a destruição de qualquer entidade social holística e com a fragmentação e atomização da sociedade.

O que Dugin quer dizer é que os Estados Unidos querem impor o seu estilo de vida, baseado na competição, no individualismo e no materialismo sobre todo o mundo, sufocando as formas mais tradicionais e naturais de existência, dissolvendo as identidades nacionais e desprezando as raízes culturais dos povos.

Porém, explica Dugin, contra essa ordem americana, existem grupos que se opõem, propondo configurações globais alternativas. Um deles seria o mundo islâmico e outro o neo-socialismo. Porém, há também o eurasianismo, o qual o professor representa. O Eurasianismo propõe simplesmente a divisão do mundo em grandes espaços, com a união de nações através da comunidade de valores e princípios. Seria, então, um mundo repartido em blocos ideológicos, cada um possuindo seu próprio estilo de vida e, consequentemente, sua própria maneira de viver, incluindo aí, seu próprio sistema econômico. A proposta eurasiana é o rompimento com a ordem político-econômica global, como ela vem sendo desenhada, para apresentar um modelo alternativo, que, se diz não querer dominar o mundo inteiro, certamente quer ter autonomia para dominar as nações que estiverem sujeitas à sua própria ordem.

Sendo assim, é um objetivo manifesto da ideologia eurasiana fazer com que a Rússia rompa com o sistema global atual. Isso significaria, segundo sua perspectiva, a libertação em relação ao imperialismo americano e uma verdadeira independência daquilo que é considerado por ela como uma imposição de uma forma de vida que é uma afronta às tradições e história russas.

Há diversas teorias que sustentam a ideologia eurasiana e que precisam ser compreendidas com mais profundidade. Por ora, é preciso entender que se trata de uma ideologia revolucionária, com elementos socialistas e fascistas, que tem como objetivo não apenas romper com uma ordem imposta desde fora, mas que pretende criar uma nova ordem, da mesma maneira autoritária.

De onde virá nossa salvação

Após a II Guerra Mundial, os Estados Unidos emergiram como a grande potência mundial, pelo simples fato de ter sido a economia menos afetada por toda aquela confusão.

De lá saiu o Plano Marshall, que socorreu as outras nações, mas que, ao mesmo tempo, consolidou a América como a potência principal do mundo e, portanto, a liderança natural do planeta.

Agora, chegou a hora da vingança. Todos os movimentos geopolíticos paralelos ao combate à pandemia mostram que as economias ocidentais irão sair dela arrasadas, necessitando da ajuda de quem sofreu menos prejuízo com tudo.

E os países que estão saindo fortalecidos, quase incólumes, dessa quebradeira que já se apresenta são exatamente a China e a Rússia.

Portanto, está claro, caso não surja uma solução rápida para a contenção dessa loucura, a quem nos submeteremos nas próximas décadas.

Seremos mera colônia do Partido Comunista Chinês, para a alegria de muita gente aqui no Brasil.