Brasileiros que somos, acostumados a vermo-nos como um país culturalmente inferior, onde a intelectualidade é semeada em solo pedregoso, acabamos por ter nossos olhos fechados para preciosidades que possam existir em meio a essa aridez. Costumamos reclamar de nossa pobreza intelectual, mas, talvez, se olhássemos com mais atenção e procurássemos com mais afinco, encontraríamos homens que se dedicam à inteligência com profundidade e erudição, bem aqui, nestas terras tropicais.

Há pessoas laborando na surdina, mais preocupados com o aprofundamento de seus próprios estudos do que com anunciar ao mundo sobre o que fazem. Há quem já tenha, inclusive, uma obra consistente e, se fôssemos um pouco mais atentos, reconheceríamos-na, dando a ela os devidos méritos.

José Nedel é um desses autores e ter acesso a sua obra acende, em mim, uma pequena chama de esperança. Homens como ele – brasileiros como ele – despertam-me para o reconhecimento de que deve haver muitos conterrâneos desenvolvendo trabalhos sérios e importantes, mas que não são vistos, nem por aqueles que promovem a cultura do país, nem mesmo por nós, que caminhamos à margem, e que, às vezes, cometemos o erro de fecharmo-nos em outros círculos marginais.

Símbolo desse esforço silencioso, o livro “Uma teoria do conhecimento” reflete toda a erudição de seu autor. Dentro de uma visão crítica e realista, franqueado na tradição gnoseológica ocidental e alinhado com um neoescolasticismo renovado, Nedel esbanja conhecimento – sem ser um mero coletor de informações – sobre o desenvolvimento da epistemologia entre os maiores pensadores de todos os tempos. Ele ainda presentea-nos com suas próprias opiniões e, com evidente profundidade analítica, oferece-nos mais que um panorama da evolução do pensamento, mas também seu significado e contingências.

Ler “Uma teoria do conhecimento” é fazer uma viagem crítica através das maiores mentes que este mundo conheceu, entendendo como elas compreendiam a relação do ser humano com a realidade, o conhecimento e a verdade. Ter acesso a esse livro, além de tudo, é voltar a ter a convicção de que grandes obras nem sempre são aquelas que todos reconhecem e divulgam, mas podem sobreviver quietas, porém, como uma planta que floresce em terras áridas, servir de inspiração para os sortudos que, como eu, tiveram a graça de deparar-se com ela.