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A lenda da meritocracia capitalista

Por entenderem o capitalismo como um sistema fechado, quase mecânico, pelo qual, com a aplicação das fórmulas certas e com bastante trabalho e inteligência, se alcançará inevitavelmente a prosperidade, muitas pessoas concluem que nele prevalece a meritocracia. 

Parece até que numa ordem capitalista o melhor trabalho é sempre reconhecido, o maior esforço melhor remunerado e as boas ideias ordinariamente acolhidas. Porém, todo mundo sabe que não é assim que as coisas funcionam.

A meritocracia pressupõe um sistema lógico de recompensas, dando a cada um o que lhe é devidamente merecido. Porém, para haver retribuições justamente oferecidas é necessário que haja um poder central incumbido dessa distribuição. No capitalismo, contudo, acontece exatamente o contrário: a distribuição das recompensas ocorre de forma descentralizada, ou seja, é cada consumidor o responsável por pagar (recompensar), dentro de seu universo limitadíssimo e pelas razões mais insondáveis, o fornecedor.

Por esse motivo, no sistema capitalista os resultados não obedecem nenhuma lógica pré-estabelecida. Fórmulas idênticas alcançam termos diferentes, modelos aplicados dão frutos díspares e os produtos de aplicações equivalentes invariavelmente difereciam-se de maneira absoluta.

A meritocracia pressupõe que os melhores estão sempre à frente, mas no capitalismo o que mais vemos é o medíocre suplantar o gênio e o néscio ter mais conquistas que o inteligente. Relacionar ambos, portanto, não tem sentido.

Na verdade, a sociedade que tentou ser meritocrática, com seu lema “tomar de cada qual segundo suas capacidades e dar a cada qual segundo suas necessidades” foi a comunista – e todos vimos no que deu a experiência.

Meritocracia ou liberdade

A ideia de que o capitalismo é baseado na meritocracia talvez seja mais uma entre aquelas criadas pelo seus adversários para desmoralizá-lo. A expressão meritocracia sugere um sistema pelo qual os esforços são recompensados, os talentos reconhecidos e o sucesso dos mais capacitados garantidos. Como isso é impossível, por razões óbvias, referir-se ao capitalismo como um sistema meritocrático serve apenas para fazê-lo parecer injusto e pernicioso.

Na verdade,  o capitalismo não é meritocrático de maneira alguma. Isso porque, para que fosse, precisaria ter total controle do processo de recompensas praticado dentro dele. Ocorre que o capitalismo é baseado, principalmente, na garantia da liberdade de transações entre as pessoas na sociedade. Em um sistema de livre comércio, o controle que se exerce sobre a economia é mínimo, impossibilitando qualquer garantia de justiça nos reconhecimentos dos méritos. Até porque, a partir do momento que os homens são livres para fazer seus negócios, nada garante que serão sempre justos e que sempre identificarão o que é melhor. Pelo contrário, homens são falíveis e estão sujeitos às mais diversas circunstâncias. Sendo assim, aqueles que alcançam maior sucesso nem sempre são aqueles que mais o mereciam.

O capitalismo, na verdade, tem como sua característica principal, não o reconhecimento do mérito, mas a garantia do livre-mercado. Isso significa que em um sistema capitalista as pessoas são livres para buscar sua felicidade da maneira como melhor lhes apraz, usando dos instrumentos que acreditam melhor lhes servir, sem uma interferência de qualquer poder externo. O que o capitalismo oferece, de fato, é a garantia da liberdade, não do reconhecimento.

Diferente do comunismo que, desde o princípio, suportado por suas ideias igualitárias, ofereceu“tomar de cada qual segundo suas capacidades e dar a cada qual segundo suas necessidades”. O que ele prometia, portanto, era que as pessoas ofereceriam conforme fossem capazes de contribuir e receberiam conforme precisassem, ou seja, o que cada cidadão de uma sociedade comunista deveria esperar é que seus esforços seriam tomados e recompensados de maneira justa, quer dizer, conforme seus méritos.

Se há, portanto, um sistema que baseou-se nos méritos para fundamentar sua sociedade foi o comunismo, não o capitalismo. Claro, que tudo isso em tese, porque, na prática, o que se viu nos países conduzidos por autoridades comunistas foi a tirania dos líderes e a submissão do povo.

Obviamente, que o comunismo não pôde cumprir o que prometeu porque é um sistema também dirigido por homens. E apesar de possuir um poder centralizado que, em tese, seria a única maneira de distribuir os méritos de forma controlada e justa, homens são falíveis e não podem garantir que farão justiça sempre. Além disso, já ficou demonstrado que toda tentativa de criar uma justiça econômica predeterminada está fadada ao insucesso. Basta observar como o delírio comunista provou que qualquer tentativa de planificar a economia, com a pretensão de justiça, foi o primeiro passo para tornar todos miseráveis, com exceção daqueles que estavam no controle do processo, que enriqueceram proporcionalmente ao empobrecimento de todo o restante da população.

Por tudo isso, a meritocracia não pode ser um fetiche liberal. Nada garante que haverá justiça na distribuição das recompensas. No entanto, uma coisa o livre-mercado pode garantir: que cada pessoa terá liberdade para, dentro de suas circunstâncias e capacidades, tentar encontrar o melhor caminho para sua prosperidade.