Uma atitude muito ruim em política é pensar tudo apenas no plano das teorias, esquecendo que são os atos e os fatos concretos que dão o rumo definitivo às coisas. Não que eu advogue uma política exclusivamente da práxis. Longe disso! A política, quando circunscrita apenas ao campo da ação, se torna a base para todo tipo de tirania. No entanto, também não é possível acreditar que bastam boas idéias para que tudo funcione na mais perfeita harmonia. Aliás, esta é a grande arte da política: conseguir unir teoria e prática, de maneira que esta cumpra o determinado por aquela, da melhor maneira possível.

Todavia, quando nos deparamos com libertários, que, normalmente, são aqueles rapazes bem arrumadinhos, bem criados e originários de famílias respeitadas, pregando a respeito da liberdade individual, da diminuição absoluta do Estado e de como é importante a livre iniciativa, quase temos de aceitar que eles estão absolutamente certos. O único problema é que eles não conseguem entender que não é porque uma idéia é boa, em tese, que ela pode ser aplicada sempre irrestritamente.

A sociedade é um agrupamento complexo, com demandas e necessidades diversas e difíceis de serem conciliadas. Além disso, há o problema da disputa política e pelo poder, que não permite que, simplesmente, as coisas sejam deixadas para serem resolvidas pelos indivíduos, sem qualquer intervenção de instituições superiores.

Qualquer pessoa de bom senso sabe que o Estado forte é um mal e um perigo. Também entende que o indivíduo é aquele que deve ser protegido e valorizado. A pergunta, porém, que alguns libertários esquecem de fazer é: quem é que vai proteger e valorizar os indivíduos? Quem vai conciliar suas divergências? Quem os protegerá dos ataques internos e externos a sua liberdade?

O libertarianismo, em tese, é uma proposta interessante. Como um ideal, pode ser ensinado. Todavia, quem quer que pretenda resolver todos os problemas sociais por uma aplicação ampla e irrestrita de suas idéias vai ter de se deparar com as impossibilidades intrínsecas da própria existência das nações e das sociedades. Há problemas que a mera liberdade não resolve.

Por isso, quando um libertário critica uma ação estatal, sem considerar o contexto e as circunstâncias dela, corre o risco de estar cometendo uma injustiça, quando não exaltando, ainda que indiretamente, adversários posicionados no pólo oposto de suas teorias.

Quando, por exemplo, um libertário diz que a atuação estatal, mesmo em períodos de conflito, como foram os anos do governo militar no Brasil, é, simbolicamente, mais nociva do que o que representam os próprios atos daqueles que lutaram abertamente para impor uma diradura comunista no país, fica claro que ele está raciocinando apenas no campo das idéias e, pior, com base em lugares-comuns que não podem ser aplicados irrestrita e universalmente.

Quem diz isso esquece que se a ação dos militares representava a presença forte do Estado, por outro lado se não houvesse essa atuação o que estaria sendo imposto à nação era algo muito pior, mais tirânico, mais escravizante.

No período militar o Estado era forte, sim. No entanto, para as pessoas comuns ele não passava de um segurança poderoso, que jamais se metia em sua vida e em seus empreendimentos privados. O governo militar foi forte, principalmente, para os guerrilheiros comunistas, que queriam, de toda maneira, transformar o Brasil em uma ditadura tão cerrada como a de Cuba.

Todo libertário tem o direito de não querer viver sob um governo forte como o militarista. O que ele não pode é dizer que, em toda e qualquer circunstância, o Estado que ele odeia não seja necessário, até para proteger a liberdade que ele tanto preza.

Na verdade, aqui no Brasil, todo libertário deveria ser muito grato em relação aos militares. Até porque, se hoje ele pode falar abertamente sobre suas idéias e pregar livremente que a tirania estatal é um mal a ser combatido, é porque, lá atrás, homens fardados, lançando mão do aparelho estatal, impediram que terroristas loucos impusessem sobre o país a mais terrível ditadura comunista, onde o libertário teria de pôr o rabo entre as pernas e calar a boca para não ser enviado para o paredão.