Autor: fblanco75

Homofobia universalizada

A não ser que a pessoa seja uma irrestrita simpatizante da causa gay, será considerada homofóbica

As palavras são uma arma essencial para alterar o imaginário das pessoas e, se usadas de certa maneira, podem criar realidades, ainda que estas firam o bom senso e até a lógica. O termo homofobia é um exemplo disso. Ele foi ampliado de tal forma pela militância homossexual que qualquer um que expresse qualquer tipo de discordância ao estilo de vida gay é tido, de fato, por criminoso. Isso porque homofobia deveria se referir apenas a uma atitude de violência extensiva contra a homossexualidade. Homofobia, se fosse respeitado o sentido correto da composição do termo, deveria se referir apenas àqueles que consideram que a homossexualidade é uma mal que deveria ser extirpado pela força, que perseguissem homossexuais, que quisessem matar gays.

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A culpa é uma víbora cornuda

A culpa é um sentimento universal. Desde que o sujeito não seja um psicopata, haverá em sua história pessoal fatos que, se ele pudesse, reescreveria de maneira diferente. Não há, como a geração pós-freudiana tem preferido acreditar, um estado ideal de completa indiferença a todo tipo de culpa. Independente da fé religiosa e da cultura, sempre haverá atos e palavras que, se fosse possível, seriam refeitas na vida das pessoas. Não há ninguém são que não se arrependa de algo em sua própria história e, de alguma maneira, não seja incomodado por esse erro.

Sendo assim, todos, de certa forma, precisam encontrar meios de lidar com essa culpa. A psiquê humana é muito criativa ao fazer isso. Por isso, o homem sempre encontra um jeito de tornar a culpa suportável. Se não o fizer, o suicídio é provável.

Então, há aqueles que negam os erros, encontrando racionalizações que os justifiquem. Há, ainda, os que, mesmo assumindo as falhas, racionalizam no sentido de justificá-las em favor de um bem futuro, transformando um erro em uma possibilidade. Outros, de uma maneira menos sutil, meramente esforçam-se por apagar os erros cometidos da memória, para que o esquecimento leve consigo a culpa.

Todas essas formas e outras que a mente humana é capaz de criar simplesmente não enfrentam o problema da culpa, mas tentam substitui-la por algo que tenha a pretensão de sufocá-la somente.

Como o personagem Dorian Gray, de Oscar Wilde, que, atormentado pelo peso de sua vida corrupta e seus erros, acredita que pode libertar-se dessa culpa apagando os rastros materiais de seus crimes. Como se uma alma corrompida pudesse ser limpa pelo olvido.

Na verdade, o que não havia em Dorian Gray, como em muitas pessoas que justificam seus pecados das maneiras mais criativas, é a confiança que seus erros poderiam ser realmente apagados. Como o personagem de Wilde, como bons filhos dos séculos científicos, que se não esquecem de Deus, o afastam dos negócios humanos, os homens não confiam mais que há uma misericórdia divina disponível que lança “todos os nossos pecados nas profundezas do mar” (Mq 7.19).

Nesta geração, a culpa jamais é extinguida. Ela pode ser sufocada, esquecida, negada, mas sempre estará à espreita, como uma víbora cornuda (Gn 49.17), esperando o momento para dar o bote.

Por isso, a solução cristã é a única possibilidade de redenção humana, porque é a única que alia o alívio da culpa com o arrependimento. É a única também que permite uma participação humana efetiva e consciente nessa redenção. Isso porque o que Deus oferece para o homem não é apenas ter seus pecados apagados, mas a oportunidade desse homem retomar sua vida, dando a ela um novo rumo, uma nova história, um novo sentido.

A velhinha de Zaragoza e o espírito de nosso tempo

Fatos isolados, muitas vezes, representam fielmente o espírito de uma época. Há certas atitudes que, ainda que pareçam únicas, são, na verdade, uma amostra perfeita de seu tempo. Quando, há um ano, li a notícia da velhinha de Zaragoza, que, ao tentar restaurar uma pintura do século XIX com a imagem de Cristo, simplesmente a destruiu, tornando-as, ela e a pintura, objetos de zombaria e escárnio, pensei: ‘Está aí uma demonstração exata do que fazemos’!

Cristo no parece, por tantas vezes, desgastado com o tempo. Seu olhar místico atrai pela peculiaridade, mas as marcas dos anos se mostram mais fortes que tudo. Ao olhar para ele, ainda é possível captar a singeleza de seu semblante voltado para as coisas celestiais, mas a ação dos elementos deste mundo insistem em tomar, pouco a pouco, sua beleza. Vendo a imagem de Cristo corrompendo-se assim, esperamos, inconsolavelmente, o dia em que nada sobrará de sua face.

E é insuportável ver Cristo se apagando. Não importa que o desgaste se dê por culpa nossa, que deveríamos abrigá-lo com zelo. Nem importa que o nosso descaso seja o seu maior promotor. Queremos apresentar um ícone apreciável, afinal, uma imagem em decomposição não é muito atrativa. E Cristo, pensamos, precisa ser agradável aos olhos e às sensações.

Surge, então, nosso espírito restaurador. E todo homem o possui em latência. Se Cristo não é mais tão agradável, porque os tempos o desgastaram, há em cada um de nós o anseio por reforma pronto para lançar-se sobre a a figura do Messias e fazê-la de acordo com nossas expectativas. Que seja a fazer isso um moço ou uma senhora octogenária não importa! Sob a conivência daqueles que também não se agradam com a imagem desgastada de Jesus, qualquer um que se lance à empreitada de sua restauração não é impedido. Nem mesmo os sacerdotes o fazem. Eles mesmos, filhos de sua época, anseiam sempre por mudanças.

O que mais espanta, no entanto, é a petulância com que nos dignamos possuidores dos talentos necessários para obra tão difícil. Cremos, sinceramente, que nossos paradigmas, nossos conhecimentos e nossas percepções são suficientes para restaurar o deus quase esquecido. Sequer nos preocupamos a respeito das razões da obra-prima. O seu criador, para nós, é como se não existisse. Como se o Cristo não tivesse uma origem, uma finalidade, uma razão. Quando nos colocamos a reviver um Jesus quase perdido, o fazemos baseados em nossas abstrações, em nossos prismas individuais, em nossa própria visão da vida.

Borramos-no, então, sem medo! Não há compromisso algum com o projeto original. E fazemos isso não porque queremos oferecer um novo deus para o mundo, mas porque acreditamos que o Cristo que surgirá de nossas mãos será o retrato fiel do original. Cada um de nós se crê o restaurador e o intérprete final da obra como ela fora apresentada ao mundo.

Lançamo-nos, então, com audácia e descuido sobre Jesus. Derramamos sobre ele nossas tintas descuidadas e arrogantes. O resultado que alcançamos, com isso, não é nem uma nova imagem atraente, nem o renascer revigorado da velha imagem desgastada. O fruto dos pincéis soberbos que carregamos, instrumentos de nossa própria petulância, é um borrão de Cristo, que não apenas não lembra nada o original, mas serve de escárnio para o mundo inteiro.

Onde o céu e a terra se encontram

Não nego! Há momentos que o desejo que bate no peito é o de mandar às favas a civilização e fazer como George Orwell e ir morar em uma casinha em um litoral inabitado qualquer, sem mais contato com o mundo, sem mais preocupações temporais relevantes. Invade-me uma vontade de apenas sentar com os livros em volta, com a Bíblia ao lado e alçar meus pensamentos apenas para a eternidade, para as coisas superiores.

O mundo cá embaixo anda demasiado esquisito. Os alicerces sobre os quais nos apoiamos parecem ser apenas fantasia de retrógrados delirantes – pelo menos é assim que esforçam-se para que pareça. Travar qualquer tipo de diálogo mais profundo está se tornando cada vez mais difícil, e mesmo os embates estão perdendo a graça, pois até para isso é necessário que haja algum acordo entre as partes.

O problema é que nem mesmo a realidade parece a mesma. O mundo que boa parte das pessoas vive é um sistema paralelo de crenças e convicções que nem mesmo tangencia a vida como eu mesmo a enxergo. É verdade que ainda há pessoas que parecem comungar algo comigo, porém estão tão longe e são tão poucas que desanima tentar uma aproximação.

Estes, talvez, sejam os sentimentos de uma parte de brasileiros que, por circunstâncias e por esforço, entenderam algo do estado de coisas que estamos vivendo. O passaporte está virando um objeto de desejo, e só não deixam estas terras por causa dos vínculos, das responsabilidades e dos afetos que, eventualmente, ainda os prendem por aqui.

Diante do desejo de escape, o grande desafio para o brasileiro inteligente, que crê e se preocupa com as coisas mais elevadas do espírito, é encontrar o ponto de equilíbrio entre uma vida submersa no lodo das preocupações comezinhas cotidianas e a contemplação e reflexão sobre a perenidade da eternidade. O problema é que se a realidade diária da vida material pode ser sufocante e alienante, abandoná-la completamente, ao invés de lançar o homem para a eternidade divina, talvez apenas antecipe sua solidão infernal. Isso porque se há uma promessa de eternidade paradisíaca, esta apenas é concedida para aquele que, de alguma maneira, cumpre seu papel neste mundo intermediário que vivemos. Sem entrar em detalhes teológicos, a promessa do céu apenas alcança homens nascidos – e vividos neste mundo e não podemos negar que há uma responsabilidade para cada homem. Fugir desta, ao invés de salvação, pode se tornar sua verdadeira condenação.

O exercício desafiador de todo brasileiro inteligente é, portanto, identificar os assuntos temporais que possuem alguma relevância. Na verdade, esse é o desafio do homem espiritual mesmo: ao invés de, gnosticamente, criar uma ruptura entre os dois mundos, encontrar os pontos de intersecção que mostrem como e onde este mundo se encontra com o céu, onde e quando o eterno e o temporal se comunicam, ou melhor, como fazer com que as matérias terrenas tenham alguma relevância para a eternidade.

Eu sei que muitas vezes a vontade que nos acomete é de fugir mesmo. Porém, para aqueles que creem em um Deus transcendente e, ao mesmo tempo, atuante, talvez o melhor seja ouvir a voz do bispo de Hipona e gozar das coisas celestes. Quanto às terrenas, devemos usá-las, mas para que possamos gozar as celestes.

Perseguição anticristã e as causas do silêncio ocidental

A perseguição contra cristãos não é um fenômeno recente. Desde há várias décadas, principalmente em países islâmicos, e também nos antigos e atuais regimes comunistas, igrejas são atacadas, ministros presos e torturados, convertidos expulsos de suas casas e reuniões proibidas. O que estamos vendo, portanto, no Egito não é, de maneira alguma, fenômeno novo. Há instituições, como o Portas Abertas, que informam sobre esses fatos há vários anos.

O que chama a atenção diante desse morticínio que ocorre há tanto tempo, porém, é o silêncio da mídia ocidental. Com exceção de umas pequenas notinhas esporádicas, quase sempre transformando a perseguição em conflito religioso (o que dá a impressão de tratar-se de mortes de guerra e, assim, escondem a natureza covarde da perseguição), nada mais se lê sobre isso em jornais, revistas e, menos ainda, na mídia televisiva.

Mas, além da ocultação da mídia, mesmo o povo cristão ocidental pouco se sente sensibilizado com o que ocorre pelo mundo contra seus irmãos de fé. Com exceção de figuras isoladas, a grande massa de evangélicos e católicos, ainda que tenham ouvido falar que há cristãos pelo mundo que são torturados e mortos por conta de possuírem a mesma fé que eles, no máximo conseguem dizer: “Rezemos!”, e ligam a tv para assistir o próximo programa alienante que retome o entorpecimento cotidiano de suas mentes.

Tal reação ocidental em relação à perseguição de cristãos pelo mundo não é, porém, fruto do acaso. Na verdade, é a vitória definitiva de um trabalho de modelamento cultural que sempre teve o objetivo de, por paradoxal que seja, demonizar o próprio cristianismo.

Desde o Iluminismo, o que se propaga é que a Igreja sempre foi opressora, sanguinária e corrupta. No século XIX propugnou-se que ela era escravizadora e contra o desenvolvimento científico. Desde o início do século XX vendeu-se a ideia de que ela é alienante e impede a liberdade do indivíduo. Se você nunca ouviu esses argumentos contra a Igreja é porque sua vida intelectual é nula. Em qualquer sala de aula colegial, em qualquer universidade, até, pasmem, em escolas dominicais de estudo bíblico e, pasmem mais ainda, até em catecismos isso já foi repetido.

O homem ocidental moderno e o cristão ocidental moderno veem a Igreja tradicional como algo a ser superado. Até querem ser cristãos, mas sobre novos fundamentos. Pretendem viver um cristianismo tolerante, politicamente correto, socialista – insípido, enfim.

Tudo isso, portanto, é algo que acabou se impregnando em nosso imaginário. A cultura anticristã venceu! O mundo ocidental, se ainda possui alguma religiosidade, esta apenas sobrevive deitada sobre alicerces modernos, com ideias modernas. A Igreja atual é a negação da própria Igreja. O crente contemporâneo busca valores que estão em conflito com os valores da Igreja. Basta observar a sede por conquistas materiais, por sucesso e reconhecimento. Basta ver a quantidade de cristãos que se aliam ao esquerdismo, que repetem os chavões da filosofia ateia do socialismo, que acreditam que Jesus e Marx possuem os mesmos fins. Não custa ressaltar a lassidão moral, o relativismo e materialismo que moldam o caráter de boa parte dos fiéis.

E se a própria cristandade se encontra assim, quanto pior não está a sociedade? Com a mentalidade ocidental moldada dessa maneira, não há como essa sociedade se sensibilizar com a morte de cristãos pelo mundo. Afinal, estes são simplesmente representantes de uma religião opressora, sanguinolenta e escravagista. Talvez sequer pense nessas coisas, afinal esse cidadão moderno é vazio demais para refletir sobre tais assuntos, mas, sem dúvida, a percepção que tem do cristianismo é de uma religião que não merece compaixão, pelo contrário, talvez deva ser extirpada mesmo da face da terra.

Portanto, o silêncio do oeste é, por um lado, proposital e calculado, por outro, porém, é apenas o reflexo de muitos e muitos anos de criação de uma antipatia contra o cristianismo que quedou-se impregnada na alma contemporânea. Ouvir que cristãos são perseguidos não causa mais do que uma mera curiosidade insensível. Afinal, quem mandou se aliarem a uma religião, assim, tão malvada?

Resta, para aqueles que, por algum motivo, não foram totalmente afetados pela aculturação anticristã, tentar preencher a lacuna de informações sobre o morticínio de cristãos pelo mundo e, por outro lado, influenciar positivamente a cultura, mostrando a história como ela mesma se deu. Neste ponto, qualquer mínima vitória deverá ser comemorada.

A pressa do preguiçoso

Uma sociedade não pode ter nada estável e consistente sem anos e anos de trabalho, estudo, planejamento, pesquisas e debates
O homem agrário, ao observar seu cotidiano, não tem dúvida de duas verdades inflexíveis: a de que se planta o que se colhe e a de que o que se planta hoje será colhido apenas em seu devido tempo. Qualquer lavrador sabe disso. No entanto, o homem-massa civilizado brasileiro não aprende esta lição trivial.

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A religião que eles querem

Todos buscam impor suas convicções. E para isso existe a política

Esperar moderação de um religioso é negar-lhe o que ele possui de mais característico: a posse de uma cosmovisão totalizante. O que é uma religião senão uma explicação da existência, do universo e das razões últimas das coisas? E se explica tudo, tudo abarca. Nada, dessa forma, se encontra fora do seu campo de interesse, nada deixa de ser penetrado por ela. Por isso, não existe laicidade para o religioso, já que nada se encontra separado de sua fé. Sendo assim, buscará impor o que acredita ser o melhor para todos. E se o melhor se encontra no que sua própria religião ensina, é em favor disso que lutará.

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Confundidos pelo próprio erro

Permanecer longe de Deus é como mergulhar em denso nevoeiro, onde ver as coisas como elas são é impossível, restando apenas sombras da realidade, que mais confundem do que revelam

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Rob Bell e a eternidade do Inferno

A eternidade infernal sempre será uma afronta à nossa percepção do divino. O aconchego do descanso no amor incondicional do Pai parece aviltado pela possibilidade de um castigo que é eterno. Com os instrumentos naturais, com o entendimento e sentimento apenas, acreditar que Deus permitirá que homens e mulheres sejam, sem cessar, punidos, nos parece cruel demais, mesmo em relação aos homens mais pecadores. Se alguém não sente esse incômodo, é porque está anestesiado por uma religiosidade fria, apartada da realidade.

Isso explica muito o sucesso de Rob Bell, pastor-fundador da Mars Hill Bible Church, em Grand Rapids, Michigan, nos Estados Unidos. Ao assumir uma crença universalista, tornando o Inferno, ou algo parecido, apenas uma coisa passageira, afirmando que, no fim das contas, todos serão restaurados para a comunhão divina, foi ao encontro do anseio de muitas pessoas que, mesmo sendo cristãs, não conseguem enfrentar a dureza daquela verdade revelada.

Em seu livro, “O amor vence”, o pastor Bell tenta expor sua doutrina, que, em essência, é universalista e, assim, causou certo alvoroço no meio cristão, principalmente protestante. No entanto, esse debate ocorre menos pelo tema em si, que é tão velho quanto o próprio cristianismo, mas porque o ministro americano é quase uma celebridade e, assim, o que diz, de alguma maneira, tem influência no povo cristão, não apenas daquele país, mas chegando mesmo nestas terras longínquas.

O universalismo é, resumidamente, a crença de que todos os seres inteligentes serão, em algum momento, restaurados à plena comunhão com Deus. Assim, o Inferno, se existir, não será eterno. O fundamento principal para essa crença é o amor divino. Os universalistas acreditam que se Deus é amor, não faria sentido permitir que os homens, que em sua totalidade são objetos desse amor, sofressem infinitamente as penas infernais.

Na história da Igreja, houve pensadores universalistas, muitos deles bem conceituados, como Clemente de Alexandria e Orígenes. Entre os modernos, é conhecido o universalismo de R. N. Champlin, erudito protestante que, em seus escritos, tem servido de apoio para muitos estudantes de Teologia.

Todo esse debate, porém, não está centralizado na questão geral do universalismo, já que este não é um assunto passível de discussões por incautos e incultos. O que acaba se tornando objeto de opiniões é o consequente entendimento sobre o Inferno que a ideia universalista lega para os estudiosos, estudantes e leitores da Bíblia.

Se haverá uma restauração derradeira de todas pessoas, o Inferno, logicamente, não é eterno. Se ele existe, no máximo, servirá como um período de emenda. No fim, desaparecerá, por simples inutilidade e esvaziamento, o que o torna muito parecido com um Purgatório, na verdade.

Rob Bell crê nisso, apesar de não deixar claro se o Inferno é um lugar, um estado ou um momento. E quando se depara com as palavras de Cristo, que afirma que irão alguns pecadores “para o castigo eterno, porém os justos, para a vida eterna”, o pastor simplesmente afirma que Jesus não está falando de um castigo “para sempre”. Ora, se castigo eterno não significa para sempre, significa o quê, então? Por mais que o pastor faça um malabarismo para explicar o significado da palavra grega aion, no que ele não está essencialmente errado, já que um de seus significados seria mesmo “era”, a palavra usada no livro de Mateus, aionios, é um adjetivo que é, mais usualmente, entendido como algo sem começo, sem fim, ou sem começo e fim, ou seja, eterno. Portanto, é muito difícil interpretar de outra maneira as palavras de Jesus.

A questão principal e mais trivial, no entanto, é que o Inferno, como nos é revelado, existe, como algo sem fim, portador de penas sem fim. Ainda que compreendê-lo dessa forma seja uma afronta à percepção natural, assim é que nos está ensinado pelos Evangelhos. E é exatamente esse incômodo e essa agressão ao natural que o torna tão convincente. Sendo o extremo negativo da existência, o afastamento completo do Criador, sua realidade coloca o homem presente no intermédio entre duas pontas que o direcionam decididamente. Seria ingênuo acreditar que os seres humanos, apenas por sua intuição, raciocínio e sensibilidade naturais, fossem capazes de compreender a realidade da bondade divina e por Deus decidir. O inferno e o céu são realidades que revelam os extremos da existência, que por suas características principais – o afastamento ou a comunhão plena com Deus, têm também a função de fazer o ser humano decidir pela segunda. Sem o entendimento desses dois extremos, restaria ao homem a confusão de sua própria realidade presente, difusa, dicotômica, incerta e vacilante. Neste caso, o certo e o errado, o bem e o mal e a verdade e a mentira estariam misturados a ponto de não se diferenciarem.

Quando o pastor americano afirma, categoricamente, sobre a não eternidade do Inferno, ele está indo um pouco além do que está revelado. Mais importante, porém, de saber se ele tem razão ou não, é entender que afastar a ideia do castigo eterno do imaginário das pessoas é lançá-las na confusão de suas próprias existências dúbias. Se assim o Inferno foi revelado é porque é assim que ele deve ser entendido. O que Deus fará depois, isso é apenas problema Dele.