a mente contemporânea tem uma necessidade quase doentia de explicação de tudo, e lida muito mal com o mistério. Ela acredita que tudo o que acontece, e mesmo as ações divinas, precisa ser devidamente compreendido e devidamente explicado

Uma das práticas mais levianas que encontro no meio cristão, principalmente o evangélico, é a necessidade que muitos têm de fornecer a devida explicação para fatos que não passam de experiências, ainda que místicas, individuais. Não é incomum encontrar pastores e líderes que ensinam, como se doutrina fosse, que tais experiências são uma regra e que podem ser aprendidas como práticas infalíveis ou explicações certeiras do agir divino.

É assim que surgem diversas heresias. Alguém experimenta uma ação misteriosa, a interpreta como modelo infalível e passa a ensinar como se fosse uma regra.

Essa universalização da experiência sempre foi a força motriz dos desvios doutrinários. Foi a motivadora da criação de seitas heréticas.

Mas, paradoxalmente, o princípio do erro está menos no misticismo da pessoa do que em sua maneira moderna de pensar. É que a mente contemporânea tem uma necessidade quase doentia de explicação de tudo, e lida muito mal com o mistério. Ela acredita que tudo o que acontece, e mesmo as ações divinas, precisa ser devidamente compreendido e devidamente explicado.

De fato, esse homem moderno é escravo de um racionalismo sufocante. Para ele, não há espaço para o desconhecido, para o incompreensível. Diante do misterioso, ou nega sua manifestação ou se apressa a explicá-lo.

Mas Chesterton já dizia que “o lógico mórbido procura tornar tudo lúcido e consegue tornar tudo misterioso. O místico permite que uma coisa seja mística, e todo o resto se torna lúcido”.

A lucidez de um cristão não está, portanto, na devida explicação de tudo, mas no conhecimento da essência. O cristão vive por princípios superiores e eternos e é isso que baseia sua existência. Os fatos, as experiências, os detalhes mínimos não precisam ser entendidos plena e imediatamente. E as experiências individuais não passam disso, sem qualquer pretensão de desconstruir a verdade maior que a suporta.

E dentro dessa consciência está a aceitação do misterioso, daquilo que não pode ser devidamente explicado. Até porque a ação divina parte de algo que “nem olhos viram, nem ouvidos ouviram, nem jamais penetrou em coração humano”, ou seja, algo além de nossa experiência sensível. Portanto, não necessariamente compreensível.

A aceitação do mistério é, com efeito, imprescindível para quem busca uma vida rica espiritualmente. Negá-lo ou querer necessariamente explicá-lo só expõe a fragilidade e pequeneza do homem destes tempos, que sendo um anão se pretende um gigante.