Há tempo para tudo nesta vida. Viver é uma arte, e cabe a cada um saber tirar dela o que ela tem de melhor para ofere­cer. Salomão, provável escritor do livro de Eclesiastes, inspirado pelo Espírito Santo, fez uma meditação sobre a vida que nos faz refletir sobre como usufruímos o que temos. A vida é feita de momentos, e são estes momentos, acumulados pelo tempo, que fazem a história de cada ser humano.


Há tempo de plantar e tempo de colher, tempo de chorar e tempo de sorrir. Mais do que saber que tudo tem o seu tempo, o sábio nos ensina que não adianta tentar­mos enxergar nossa existência de uma maneira simplista. É frustrante imaginar que a vida vai ser alegre em todos os momentos, que não vão haver lutas e dificuldades. A vida é complexa, e sua beleza reside exatamente aí.

Para o cristão, a arte de viver torna-se ainda mais especial. Cercado de valores, o crente precisa enxergar a beleza da vida, ainda que sob a ótica de uma religião. O grande erro, provavelmente, está naqueles que espiritualizam a vida religiosa, sepa­rando-a como um momento sagrado, em contraste com os outros momentos seculares. Essa forma dualista de enxergar a vida acaba por impelir-nos à hipocrisia, pois quem assim a vê, tende a esperar os momentos sagrados para praticar a espiritua­lidade. Como ficam então os outros momentos? Se existem momentos espirituais, logi­camente os outros não o são. Esta é uma dedução lógica que nos leva a pensar como es­tamos errados quando fazemos tal distinção. Em nosso cotidiano, praticamos tantas atividades, que fica, às vezes, difícil diferenciar o que é trabalho, o que é estudo, o que é religião. Eu posso estar em meu trabalho e ali evangelizar alguém, ou posso estar na igreja conversando sobre futebol, por exemplo. Quem pode me dizer o que é e o que não é espiritual? Será que quando estamos comen­tando sobre o jogo de domingo, neste momento o Espírito Santo se apaga dentro de nós, aguardando o nosso próximo momento de espiritualidade? Será que Deus fecha seus olhos quando sentamos em uma roda de amigos e conversamos despreocupadamente?

Separar a vida em departamentos pode ser o maior perigo para um cristão. Nor­malmente, isso o conduz a manifestações hipócritas de santidade, a julgamentos alheios e a uma visão absolutamente estreita da vida. Quem pensa dessa maneira tem dois ca­minhos a seguir, ambos prejudiciais: tentar ser absolutamente ‘espiritual’ o tempo todo (e aí partir para a inconveniência) ou viver duas vidas completamente distintas. É muito mais maduro entender que a vida que temos é uma só. Ela é espiritual em to­dos os sentidos, pois o Espírito Santo habita em mim – e não dorme jamais. Se estou na reunião de oração, no culto de adoração ou no estudo bíblico, são todos esses momentos de espiritualidade. Mas se estou com os meus amigos, jogando conversa fora, isso tam­bém é espiritual ou o nome que se queira dar a esse momento.

Na verdade, o que estou tentando dizer, é que não devemos tentar detectar quais sãos os nossos momentos de espiritualidade, por ser isso um perigoso caminho para a compre­ensão da vida. Eu sou espiritual, e isso basta. O que faz a diferença entre o homem espiritual e o mundano são seus conceitos, precei­tos e valores. Quando nossos valores estão voltados para os bens celestiais, as virtudes, a piedade e o amor, tudo o que fazemos agrada a Deus.

Volto para Eclesiastes: há tempo para tudo. Há o tempo de orar, e o tempo de brincar; há o tempo de contrição, e o tempo do largo sorriso; há o tempo do choro, e o tempo da risada alegre; há o tempo da reflexão, e o tempo da banalidade sadia; há o tempo do velório, e o tempo das festas; há o tempo da carestia, e o tempo da abundância responsável; há o tempo da privação, e o tempo dos prazeres; há o tempo do amor ágape, e o tempo do amor eros; há o tempo de viver, e o tempo de morrer. Há vezes que melhor que uma oração (entendam o que digo) é a presença física num instante difícil. Quando alguém está sofrendo, às vezes, melhor do fazer uma oração pelo telefone, seja melhor uma visita pessoal e uma bate-papo agradável. Uma coisa não precisa excluir a outra, necessariamente. Este é o evangelho integral

O que precisamos é ter sabedoria para fazer as coisas no tempo certo, aproveitar cada momento, com responsabilidade e viver intensamente a dádiva divina que nos foi conce­dida: a própria vida.