O discurso do presidente Bolsonaro, naquela reunião ministerial, cheio de expressões fortes e até xingamentos, poderia, de alguma maneira, ser considerado um discurso bonito? Antes de acusar-me de delírio, pense um pouco e responda qual discurso pode ser considerado o mais belo: aquele que, ao final, você sai admirado com a eloquência e o trato que o orador tem com as palavras, faz um elogio, mas esquece-o logo em seguida, ou aquele que mexe com seus brios, que lhe faz balançar na cadeira e que lhe impulsiona a agir?

Obviamente, a forma do discurso é importante. Inclusive, os professores de oratória costumam ater-se praticamente apenas a ela, enquanto os alunos só querem saber dela. No entanto, apesar da estética de um discurso ser um auxiliar poderoso, ela nunca é decisiva para alcançar a persuasão. A estética é sempre dependente do conteúdo. Quando este é forte, ela ajuda a fortalece-lo ainda mais; quando fraco, porém, nem a maneira mais bela de dizê-lo pode socorre-lo.

O fato é que há beleza além da estética. Um bebê é belo, mesmo tendo carinha de joelho; um cachorrinho pug é belo, apesar de parecer um monstrinho; uma velhinha de cem anos de idade é bela, ainda que com o rosto completamente enrugado; a simplicidade de um homem honesto é bela, a despeito de seus modos rústicos; a verdade sempre é bela, mesmo quando acompanhada dos modos mais grosseiros.

Por isso, quando nos referimos à beleza de um discurso, temos de olhar para além da forma. Não é apenas o bom trato das palavras, a boa colocação das frases, a escolha das expressões mais bonitas e a elegância na construção do pensamento que podem ser considerados bonitos. Existe uma beleza mais sutil, e certamente mais poderosa: a de um discurso sincero, direto, honesto e profundo, que explode do fundo do coração do orador.

Quando uma mensagem jorra da alma de um homem, ela se torna irresistível. Supera a frieza morta da letra, adquire vida e todo aquele que com ela tem contato acaba sendo por ela influenciado. Ninguém consegue ficar indiferente a uma declaração de amor honesta, nem à expressão de ódio sincera; uma pessoa normal se incomoda com o lamento genuíno, como não consegue desprezar um crítico franco.

Se testemuhamos alguém falando palavrões, xingando, usando expressões impróprias para o seu cargo, tropeçando nas próprias construções de suas frases, exaltando-se mais do que a liturgia aconselha, mas, ao mesmo tempo, percebemos que ele fala com o coração na mão, com a honestidade que denuncia que suas palavras são o fiel retrato de sua alma, não há como não sermos tocados pelo seu discurso. Acabamos, inclusive, considerando esse discurso belo, menos por seu refinamento estético do que pela simples beleza que reside em tudo aquilo que revela o que é verdadeiro.