Tag: Internet

O interesse de “O dilema das redes”

A reflexão, que a primeira parte do documentário “O dilema das redes” traz, sobre como as redes sociais são manipuladoras, é importante – se bem que nada do que se fala ali é novidade para uma pessoa minimamente informada.

A despeito disso, as intenções por trás do filme me parecem bastante obscuras. Querer que eu acredite, por exemplo, que ex-executivos arrependidos se juntam para denunciar seus antigos empregadores, por estarem preocupados com o destino da sociedade, é abusar da minha inocência.

De qualquer forma, o filme começa mostrando como as redes sociais são desenhadas para viciar seus usuários, prendendo-os o máximo de tempo nelas. Em seguida, explica como funcionam os algoritmos e como eles rastreiam os gostos e interesses do público.

Até aqui, a obra pode servir de um bom instrumento para reflexão. Vivemos a era da manipulação mesmo, quando todas as técnicas de influência da mente estão sendo colocadas em prática concomitantemente – é realmente assustador!

No entanto, não se deixe enganar: a própria narrativa do documentário, que denuncia a manipulação, é construída de maneira a manipular o espectador. Trata-se praticamente de uma metanarrativa.

Até a metade da peça, o filme ganha a confiança do espectador, por meio da autoridade dos heróis e da grandeza de sua causa. Além disso, gera identificação, apontando um inimigo comum, inclusive dando vida a ele por meio de personagens humanos. Por fim, faz o espectador sentir-se fragilizado e dependente do socorro dos heróis ao mostrar que a questão é muito complexa e que o resultado, se nada for feito, será o caos.

Quando, então, quem acompanha o documentário já está devidamente capturado pela peça, tendo depositado nela sua confiança, a estória dá um salto interessante e mostra, de fato, para que veio.

A partir do meio do filme, o roteiro começa a apontar as consequências sociais da forma como as redes sociais manipulam seus usuários, especialmente criando bolhas de interpretação, o que facilitariam a polarização e a radicalização.

Com isso, a conclusão que ele chega é que o extremismo político é fruto das técnicas manipulatórias que as redes usam para manter seus usuários engajados. A onda de notícias falsas seria, então, efeito colateral dessas bolhas de interpretação da realidade que as redes sociais criam.

No entanto, para os idealizadores do documentário, fake news é algo bem específico: tudo aquilo que vai contra o que dizem a grande imprensa, o consenso científico e o establishment político (e aqui as intenções começam a ficar mais claras).

Para eles, terraplanistas, negacionistas do aquecimento global, contestadores do coronavírus, denunciadores de redes de pedofilia e os chamados teóricos da conspiração seriam, assim, tudo farinha do mesmo saco. São os filhotes das redes sociais e os responsáveis por disseminar notícias falsas.

Por consequência, segundo o argumento da obra, as redes sociais são as responsáveis, por conta das fake news, por influenciar negativamente as eleições no mundo inteiro (com destaque especial para o Brasil), ameaçando assim o bom andamento da democracia.

No entanto – ironia das ironias – a mensagem do filme, acaba, segundo qualquer critério razoável de interpretação, caindo naquilo que pode ser chamada de uma verdadeira teoria da conspiração.

Por exemplo, o documentário diz que a Rússia manipulou as eleições dos Estados Unidos. Como, porém é sabido que a tese de fraude das eleições já foi descartada, o argumento é que a Rússia interferiu, mas usando das ferramentas legais de manipulação que as redes sociais oferecem.

A outra afirmação do documentário é de dar inveja aos mais radicais teóricos da conspiração: as empresas que controlam as redes querem criar o caos social. Agora, imaginem o quanto esses argumentos pareceriam ridículos se fossem exposto por qualquer um daqueles tidos por extremistas do outro lado!

É interessante como um documentário feito para mostrar como o mundo anda radical, perigoso, cheio de teorias fantásticas, tem, no centro de sua narrativa, duas teses, no mínimo, bastante controversas, que poderiam ser chamadas, sem qualquer exagero, de teses conspiratórias.

Fica claro, portanto, que a questão não é o radicalismo, nem as fake news, nem mesmo as teorias da conspiração. O problema é o lado que as narrativas estão. Aquelas que não se encaixam nas que os roteiristas concordam são perigosas e devem ser evitadas. Por outro lado, as suas próprias narrativas são perfeitamente aceitáveis, por mais absurdo que pareçam.

O que os idealizadores do documentário fizeram, apenas, foi dar uma aparente explicação para essas narrativas indesejáveis, apontando os culpados originais (bode expiatório) e criando, assim, a explicação que justifica a perda do monopólio narrativo dos antigos grupos de poder.

No fim das contas, “O dilema das Redes” me parece apenas um grito de desespero de quem já não sabe mais o que fazer para ter de volta o controle do discurso, da maneira como teve por décadas.

Hiperconectividade

Quando eu era jovem, nos tempos que não havia a chance de estar o tempo inteiro em contato com outras pessoas, precisávamos aprender a ter as nossas próprias diversões, os nossos próprios passatempos; precisávamos descobrir coisas que pudéssemos curtir a sós, sem esperar que os outros participassem disso.

Eu escrevia poesias que nunca ninguém leu, imprimi jornalecos que sonhava publicar em maior escala, mas que nunca saiu da matriz original, fiz músicas que só eu cantei e escrevi textos que jamais foram testemunhados por leitor algum.

Éramos forçados a ter vida própria e a desenvolver uma capacidade de ficar sozinhos. Quem tinha maiores dificuldades para isso precisava dar-se ao trabalho de sair, de buscar companhia fora de casa. No entanto, em geral, todo mundo era forçado, em alguma medida, a viver por si mesmo.

Hoje, essa conexão total, proporcionado pelas tecnologias, gera um certo tipo de dependência em relação aos outros. Parece que ninguém mais consegue fazer ou pensar em nada sem sentir a imperiosa necessidade de compartilhar isso. Nada mais parece ser uma atividade meramente interior, individual, apenas nossa.

Esse tipo de vida totalmente compartilhável, acredito eu, vai tornando as pessoas superficiais. Elas vão perdendo a capacidade de explorar o próprio interior, de perscrutar seus motivos mais internos, aqueles que só se revelam no silêncio profundo do próprio ser, na ausência de testemunhas e na completa falta de expectativas em relação ao pensamento alheio.

Com a possibilidade de contato constante, de feedback ininterrupto, as pessoas vão perdendo a motivação e a coragem de viverem consigo mesmas. Como o mundo está sempre disponível, sempre de ouvidos aparentemente atentos, o recolhimento já não é mais uma opção.

O que me parece é que estes tempos de hiperconectividade vai fazer com que a geração que neles vive seja a mais comunicativa de todos os tempos, mas também a mais superficial, a que menos entende a si mesma e às suas próprias motivações. E nós, de gerações anteriores, corremos o risco de sermos conduzidos para o mesmo mal.

Idiotices juvenis

Quando eu era menino, tinha minhas ideias esdrúxulas sobre sociedade e politica. Acreditava que daquela mente fértil poderiam sair soluções definitivas para o mundo. Porém, eu possuía uma vantagem em relação aos jovens de agora: aquelas propostas não ousavam, nem podiam, sair do âmbito de minha própria cabeça, quiçá de algum caderninho jamais lido por ninguém além de mim mesmo. Isto foi muito bom para mim e para o mundo. Permanecemos ambos seguros da aplicação de tanta estupidez. Hoje, de forma diferente, qualquer moleque escreve suas idiotices nas redes sociais e todo o mundo pode ler. O pior é que, algumas vezes, são até levados a sério.

Os velhos formadores de opinião já não influenciam mais

Tenho lido que a maior emissora de tv do país tem perdido, cada vez mais, sua audiência. E não é só isso, são números conhecidos aqueles que se referem à queda brusca que a mídia impressa tem sentido na venda de seus jornais. Parece que os velhos líderes de audiência estão perdendo seu posto.

É notório que as pessoas que dirigem essas mídias não refletem exatamente a cabeça do cidadão comum. Eles são vanguardistas, são sempre mais libertinos, sempre mais avançados. Só que, até aqui, eles estavam acostumados a ser a referência pensante, os determinadores da moda, de como as pessoas deveriam se comportar e como agir.

O problema, para eles, é que com o advento da internet, as pessoas descobriram que essas “cabeças pensantes” não eram as únicas e que haviam outras que refletiam muito melhor aquilo que elas mesmo pensavam. Os velhos “formadores de opinião”, tão acostumados a serem os únicos, sofrem agora com a concorrência de gente que aparece do nada e começa a fazer a cabeça da galera.

Na verdade, a velha guarda está sendo desmascarada. As pessoas já perceberam que o que eles dizem não corresponde a uma verdade absoluta e que, enquanto eles apresentam uma ideia, existem centenas e outras pessoas dizendo o contrário.

Então, como esses antigos influenciadores não sabem pensar de outra maneira, pois já estão completamente corrompidos com sua própria estupidez, só lhes resta espernear contra a rebeldia do povo, que não aceita mais se submeter aos devaneios alucinógenos de intelectuais caquéticos e cada vez menos se interessa por consumir suas bostas enlatadas.